Projeto de lei da terceirização: um avanço do retrocesso

Projeto de lei da terceirização: um avanço do retrocesso, por Ulysses Ferraz
segunda-feira, 18 de maio de 2015

Foto: Uma fábrica na Inglaterra do século XIX

“A economia é uma disputa política. Ela não é, e nunca poderá ser, uma ciência; não há verdades objetivas na economia que possam ser estabelecidas independentemente de julgamentos políticos e, com frequência, julgamentos morais.” (Ha-Joon Chang)

O argumento de que uma flexibilização na legislação trabalhista beneficiaria a geração de empregos nunca se confirmou empiricamente. É semelhante ao argumento de que a redução de impostos estimularia o investimento privado e, portanto, aumentaria a arrecadação. Em ambos os casos, o que ocorre na prática é o aumento da taxa de lucro das empresas, sem nenhuma contrapartida para a sociedade. O bem individual aumenta. O bem comum diminui. Mas os jornalões insistem em sofismar.

As duas recentes matérias do jornal O Globo sobre o Projeto de Lei 4330/2004, que regulamenta a terceirização de empresas, utilizam a palavra “avanço” em ambos os títulos: “Para especialistas e empresários, projeto é avanço” e “Terceirização avança”.

De fato, um avanço notável. Avanço nas subcontratações, prática iniciada no Brasil décadas atrás, mas que foi limitada juridicamente pelo conceito de atividade-fim.

Neste primeiro avanço, foi possível terceirizar somente as atividades-meio, isto é, aquelas que não são inerentes ao objetivo principal da empresa. Agora, com o novo projeto de lei, todas as atividades poderão ser objeto de terceirização. Situação que até já acontece na prática. Mas quando questionada na justiça, há quase sempre ganho de causa para o trabalhador e o reconhecimento da relação de emprego.

Caso o projeto seja convertido em lei, haverá convergência entre fato e direito. Vai “liberar geral”, como se diz popularmente. Portanto, mais um grande avanço para liberais, neoliberais, os alegados sociais-democratas e todas as suas variantes. Com a nova lei, para a felicidade de empresários, empresas, corporações e de seus fiéis representantes congressistas e midiáticos, toda e qualquer atividade poderá ser terceirizada, desde que não haja relação de subordinação.

Ora, essa ressalva da subordinação é mais formalista do que real, pois é muito difícil comprová-la em juízo. Na prática, haverá habitualidade e subordinação, sem que se configure juridicamente relação de emprego. Menos demandas judiciais. Mais lucros para empresas. Menos direitos para o trabalhador. O século XIX está chegando para ficar.

Para os trabalhadores, contudo, o avanço será na precarização das condições de trabalho, cada vez mais fragilizadas. Retrocesso para as conquistas trabalhistas, cujas lutas remontam aos primórdios da primeira Revolução Industrial. Portanto, avanço do retrocesso.

Como ensina o economista Ha-Joon Chang, “quando participar de uma discussão sobre economia, você deve fazer a velha pergunta: ‘Cui bono?’ (A quem isso beneficia?), tornada célebre pelo estadista e orador romano Marco Túlio Cícero”. É fácil identificar a quem beneficiará a aprovação desta lei.
Postado por Ulysses Ferraz às 05:40

 

Nota Técnica Radiografia do Gasto Tributário em Saúde 2003-2013, IPEA

O Ipea lançou nesta terça-feira, dia 31, em Brasília, a Nota Técnica Radiografia do Gasto Tributário em Saúde 2003-2013. Elaborada em parceria com a Receita Federal do Brasil (RFB), a pesquisa faz uma radiografia do gasto tributário em saúde, apresentando a distribuição do gasto, a metodologia de cálculo e a estimativa da renúncia de arrecadação fiscal neste intervalo de tempo. Para tanto, foram utilizados dados agregados dos contribuintes – seja do lado das famílias e dos empregadores, seja do lado da indústria farmacêutica e dos hospitais filantrópicos.

Estudo aponta renúncia de 25,4 bi dos gastos federais em saúde

Pesquisa faz radiografia do gasto tributário em Saúde

http://goo.gl/7tEOcG

A praga da violência coletiva

A frase do título está em um artigo de Ladislaw Dawbor, publicado neste blog em março de 2015. Apresentamos, abaixo, alguns trechos do artigo e, logo após, o link para o artigo completo:

“Pois deixando de lado alguns traumas e deformações individuais, domínio dos psiquiatras, aqui nos interessa a misteriosa bestialidade coletiva de grandes grupos sociais.”

“Muitos dizem que a solução está na educação e na cultura. Tenho minhas dúvidas … Ninguém irá pensar que os alemães eram um povo de baixo nível educacional ou cultural. E no entanto, com que entusiasmo vestiram as botas e as camisas negras ou marrons, com que elevado sentimento de dever cumprido matavam pessoas por serem diferentes, por um critério real ou imaginário. Cerca de 50% dos médicos alemães aderiram ao partido nazista. Isto é que é realmente preocupante. Estupidez é uma doença que pega.”

“Os nazistas agiam em nome da pureza da raça. E erguiam bem alto a bandeira do “Gott mit uns”, Deus está conosco. Tornar-se de certa maneira o braço executivo da cólera divina parece ser profundamente agradável. Há gente disposta a morrer por esta satisfação.”

http://dialogosessenciais.com/2015/03/03/a-praga-a-violencia-coletiva-ladislau-dawbor/

Cartomante, Elis Regina e Ivan Lins

O ministro da Transparência, Fabiano Silveira, foi flagrado em reunião com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB – AL), criticando a Lava Jato e tramando como Renan poderia escapar.

Em editorial de hoje, o O Globo mandou Temer demiti-lo. Enquanto o capacho interino não cumpre, sugiro ouvirmos a música de Ivan Lins, cantada por Elis Regina. Letra e música abaixo.

Cai o rei, cai não fica nada …

Cartomante
Ivan Lins

Nos dias de hoje é bom que se proteja
Ofereça a face pra quem quer que seja
Nos dias de hoje esteja tranqüilo
Haja o que houver pense nos seus filhos

Não ande nos bares, esqueça os amigos
Não pare nas praças, não corra perigo
Não fale do medo que temos da vida
Não ponha o dedo na nossa ferida

Nos dias de hoje não lhes dê motivo
Porque na verdade eu te quero vivo
Tenha paciência, Deus está contigo
Deus está conosco até o pescoço

Já está escrito, já está previsto
Por todas as videntes, pelas cartomantes
Tá tudo nas cartas, em todas as estrelas
No jogo dos búzios e nas profecias

Cai o rei de Espadas
Cai o rei de Ouros
Cai o rei de Paus
Cai, não fica nada.

 

 

 

 

 

 

Os mínimos e máximos da ideologia neoliberal

Margaret Thatcher’s role in plan to dismantle welfare state revealed

Newly released Downing Street documents show Tory cabinet considered compulsory charges for schooling and end to NHS

The Guardian  28/12/2012

Tradução:

Revelado o papel de Margaret Thatcher no plano para desmantelar o estado de bem-estar social

Documentos liberados recentemente de Downing Street (sede do Governo) mostram que o gabinete Tory (Partido Conservador) avaliou terminar com o ensino gratuito e com o NHS – Sistema Nacional de Saúde.

Margaret Thatcher left a dark legacy that has still not disappeared
Hugo Young, The Guardian, 08/04/2013

Tradução:

Margaret Thatcher deixou um legado sombrio que ainda não desapareceu.

A política do estado mínimo de Reagan, Thatcher e a desregulamentação do mercado financeiro norte-americano praticada pelo FED levou à quebradeira das economias ocidentais e à crise  global de 2008, presente até hoje.

Estimativas indicam que a papelada circulando no mercado financeiro global somava, em 2009, 600 trilhões de dólares, comparada a um PIB global de 54 trilhões de dólares. E as pessoas que se consideram sensatas têm coragem de defender a tese da “autorregulação” dos mercados. Os EUA sozinho utilizou 700 bilhões de dólares de recursos dos contribuintes – a tal “Mãe Visível” – para tirar os bancos do atoleiro. Harvey comentou que, ao viajar pelas cidades norte-americanas em 2009 e 2010 era possível observar o estrago que a crise do subprime fez nas cidades e na vida das pessoas. Em sua opinião, os 700 bilhões de dólares teriam sido melhor empregados se tivessem sido investidos nas comunidades e em minorar o sofrimento das pessoas em vez de terem sido utilizados para salvar bancos viciados no cassino financeiro dos mercados especulativos de opções, futuros e derivativos.

Este texto serve como introdução ao excelente artigo de Ulysses Ferraz, publicado em seu blog no ano passado. Tendo em vista as primeiras ações do governo interino usurpador de Michel Miguel Temer podemos observar que se trata de artigo premonitório. Infelizmente Ulysses Ferraz sempre antecipa e acerta na mosca. Infelizmente. Nos esperam tempos sombrios.

Paulo Martins

Segunda-feira, 15 de junho de 2015
Os mínimos e máximos da ideologia neoliberal

Foto: Kuwait 1991 “Operation Desert Storm 22” – David McLeod
“O governo existe para nos proteger uns dos outros. O ponto em que o governo foi além de seus limites foi quando decidiu nos proteger de nós mesmos.” (Ronald Reagan)

Sob o pretexto de um Estado mínimo, os governos de Ronald Reagan, George H. W. Bush e Margaret Thatcher construíram nos anos 1980/90, em seus respectivos países, Estados de segurança máxima. Colocaram em prática uma lógica de opostos. De mínimos e máximos. Uma lógica binária de minimização ou maximação. Minimizar regulamentações, impostos, benefícios sociais, direitos trabalhistas, educação e saúde públicas. Maximizar desigualdades, concentração de renda e riqueza, privatizações, terceirizações, aparatos repressivos, gastos militares, serviços de informações e espionagem. Maximizar o poder dos mercados financeiros e bancos. Maximizar a riqueza dos ricos. Maximizar bônus dos altos executivos. Minimizar salários da classe trabalhadora.

Sob o pretexto da liberdade, esses governos alimentaram bolhas especulativas, declararam guerras, cortaram benefícios sociais historicamente adquiridos e, ao contrário do discurso de austeridade fiscal que venderam para o mundo, produziram vultosos déficits públicos. Invocaram a liberdade para proteger suas economias, bombardear países, incentivar a indústria bélica, garantir suprimento barato de combustíveis fósseis e acessar mercados externos em condições vantajosas. Invocaram a liberdade para proteger seus mercados internos, ignorar acordos ambientais, instaurar o terror e conservar o antigo modo de fazer negócios. Invocaram a liberdade para implantar um sistema de vigilância próximo à distopia orwelliana, quando exerceram o controle mais abrangente e repressivo do Estado sobre o cidadão em tempos de democracia.

Sob o pretexto de um Estado mínimo e da liberdade máxima, esses governos garantiram o máximo para quem já possuía o máximo. Ofereceram o mínimo para quem não possuía sequer o mínimo. Gastaram recursos escassos para atender apenas a seus grupos de interesse. Destruíram o meio-ambiente ao máximo e entregaram sempre o mínimo em retornos sociais para a maioria da população. No final das contas, maximizaram a miséria para garantir o máximo de riqueza, renda e luxo para um mínimo de pessoas já privilegiadas.

Com o respaldo de economistas vencedores de prêmio Nobel e prestigiosos intelectuais, concederam uma aura de “legitimidade” moral para o egoísmo, para a ganância e para a destruição. Alastraram essas práticas para o resto do mundo em velocidade máxima, com um mínimo de resistência. Criaram mecanismos simbólicos e materiais para disseminar suas ideologias. Com eufemismos cínicos, construíram uma linguagem própria, uma gramática específica, para a produção de discursos pretensamente científicos e a fabricação de consenso. Capturaram os porta-vozes da grande mídia, das classes políticas e da ilustre academia. Em escala global. Deram luz a uma nova hegemonia. Lançaram trevas sobre os desfavorecidos mundo afora. E chamaram tudo isso de nova economia.

Facismo: A “besta” comerá os seus filhotes

Lamento, sinceramente, registrar que neste país facista em gestação, no qual prevalecem a mercantilização da fé ingênua, o coronelismo de mídia, o parlamentarismo de extorsão, o capitalismo de pirataria e a justiça de exceção,

sobreviver será considerado crime de responsabilidade.

Ser feliz será considerado crime hediondo.

Lembro-me quando, no ano passado, por ocasião da votação para inclusão do crime de feminicídio como crime hediondo, muitas pessoas, de ambos sexos, fizeram comentários contrários absurdos nas redes sociais.

Narrativas na TV de estupro de mulheres são aplaudidas pelo auditório, inclusive por mulheres.

O acesso das minorias a seus legítimos direitos e garantias previstos na Constituição Federal são combatidos por grupos religiosos fundamentalistas ou por grupos que disseminam o ódio.

O ministro da Educação interino recebe em seu gabinete um estuprador confesso e um representante de um grupo que trabalha pelo retrocesso e eliminação da democracia.

Se a natureza humana falir, todos perderão. Os mais fracos perderão primeiro. Depois, até os poderosos perderão. Não há facismo sem sequelas.

No facismo a besta, depois de destruir os seus inimigos, come os seus próprios filhotes.

Se empurrar, cai. Que caia.

O homem é um fraco. Outrora conhecido como bom articulador, com bom transito no Congresso, fora escolhido por Lula para compor a chapa de Dilma por isso. Ser presidente da Câmara, no entanto, é diferente de ser presidente do país, mormente onde, tradicionalmente, todas as cobranças da opinião pública recaem sobre o Executivo. O fato de o centrão legislativo ter apoiado o ascenso de Michel Miguel à presidência tem um preço: o centrão, o baixo clero, ele cobra no varejo, mas como os devedores são numerosos, o preço pode sair muito, muito alto. Quando passou a integrar a chapa de Dilma, o homem, pessoa institucionalizada, político profissional, já não tinha mais base eleitoral para se eleger deputado federal. O antigo pupilo de Quércia perdera o encanto que lhe havia emprestado o antigo cacique. O que sobrou foi o que ele sempre foi: um bacharel vaidoso, com cabelos engomados e penteados para trás, trajando ternos tão cinzentos e antiquados quanto a sua própria trajetória política, aquela cultivada sobriedade tacanha de quem, acostumado às sombras, nunca quis ser percebido. Repito, o homem se institucionalizou nos corredores verdes e ocres do Congresso, seu universo é inteiramente composto de Rêgos Lima, Calheiros, Sarneys, Barbalhos, Lyras. Ele não faz a menor ideia do que vem a ser o povo, do que o povo quer, de seus anseios. Sem precisar dialogar com esses anseios, o homem, que deve dormir de toca e pijamas de seda com monograma bordado no bolso, é um político frágil porque, há tempos, labuta apenas com uma economia de interesses bem particular, bem especializada. Falta-lhe a legitimidade que vem do contato com o mundo real. Se empurrar, o homem cai. Que caia.

Por Pedro Munhoz

O verdadeiro (principal) motivo do impeachment

Texto para discussão. Não concordo com tudo, mas reconheço que tem bom senso e é uma análise que merece leitura séria e discussão.

A VERDADEIRA CAUSA I De Bresser Pereira

“Diante do afastamento do Senador Romero Jucá, que caiu em uma armadilha preparada pelo senhor Sérgio Machado (é difícil encontrar alguém pior neste Brasil), o PT passou a afirmar paralisar a Operação Lava Jato foi a “verdadeira” causa do impeachment. Não, não foi. Foi uma das causas; é claro que o PMDB e os demais partidos querem paralisá-la, e não se conformavam com a “inação” do PT, mas a principal causa está hoje nos jornais.

A meta fundamental dos impichadores é reduzir os direitos sociais dos trabalhadores, e o governo informa que, para isto apresentará quatro reformas constitucionais: desvinculação das despesas com educação e saúde da receita e teto para elas; autorização para que os acordos sindicais prevaleçam sobre a legislação trabalhista; desvinculação de benefícios sociais do salário mínimo; e definição da idade mínima para a previdência.
O objetivo é beneficiar os capitalistas rentistas e financistas – os grandes vitoriosos do momento – para que paguem menos impostos. É reduzir os salários diretos e indiretos.

A justificativa é uma “crise fiscal estrutural”. É a tese que a Constituição de 1988 não cabe no PIB. Ora, isto é falso. Entre 1999 e 2012 as metas fiscais foram atingidas. Agora estamos em uma crise fiscal que, de fato, exige ajuste. Mas exige medidas pontuais.

Quanto às reformas constitucionais, é realmente necessário fazer alguma coisa, mas não da forma violenta que está sendo proposta. Uma desvinculação de 20% é razoável, e realmente é necessário estabelecer uma idade mínima de 65 anos, mas com um amplo prazo de carência, porque não há problema fiscal agudo na previdência hoje. A desvinculação dos benefícios sociais do salário mínimo não é necessária, mas sua manutenção significa que o salário mínimo não deverá aumentar mais, em termos reais, do que a produtividade. Prevalecer acordos sobre a legislação trabalhista é péssimo para a grande maioria dos trabalhadores, que não têm sindicatos fortes a defendê-los.

A economia brasileira está semiestagnada desde 1990 – ano da abertura comercial – porque a partir de então a doença holandesa deixou de ser neutralizada e as empresas brasileiras passaram a ter uma desvantagem competitiva muito grande. Porque a taxa de juros é muito alta desde a abertura financeira de 1992. Porque essa taxa de juros muito alta implica um custo fiscal de juros para o Estado absurdo – em torno de 6% do PIB, no último ano, 8,7% do PIB. E porque a poupança pública é muito pequena, insuficiente para financiar os necessários investimentos públicos.”