No Brasil de Temer, FMI cobra reformas e fim da valorização do mínimo

A semelhança entre as recomendações do FMI e as medidas propostas pela equipe do presidente golpista são enormes.

Das duas, uma: ou o FMI já havia mandado o dever de casa pronto pro Meireles copiar, ou a equipe do FMI veio ao Brasil convidado pelo usurpador, analisou as medidas do Meireles, aprovou e as publicou em seu relatório preliminar.

O objetivo é claro: como o governo do Fora Temer não tem nenhuma credibilidade, está pedindo credibilidade emprestada ao FMI.

O Brasil tem reservas de 370.000.000.000,00 de dólares, deixadas pelos governos do PT. Não precisa de dinheiro do FMI.

Mas Temer não tem apoio popular para enfiar goela abaixo da população brasileira as reformas que vão prejudicar as camadas mais pobres da população.

Tiveram a “brilhante” ideia de pedir emprestada credibilidade ao FMI. O problema é que depois dos fracassos nas receitas do FMI que levaram diversos países à bancarrota, o FMI também não tem credibilidade para emprestar. Danou-se …

Blog do Renato

O golpe de 2016 parece mesmo ter lançado o Brasil em uma volta no tempo, rumo a décadas nas quais o país era refém dos ditames do Fundo Monetário Internacional (FMI). Depois de uma visita oficial ao ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o órgão emitiu um comunicado no qual recomenda que o país revise a política de valorização do salário mínimo e promova as reformas trabalhista e previdenciária. Depois de 11 anos, estará o Brasil voltando aos tempos de subserviência?

 

 

No texto, o FMI mostra total sintonia com o governo de Michel Temer. Elogia as propostas anunciadas para cortar gastos e, para justificá-las, utiliza a mesma estratégia da gestão: condiciona a retomada do crescimento à aprovação das medidas de austeridade. Como se não houvesse alternativas, quase uma ameaça.

De acordo com o Fundo, a política de valorização do salário mínimo, que ajudou no combate às desigualdades no país, é…

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Boa noite, Cinderela – por Ladislau Dowbor

Boa noite, Cinderela
POR LADISLAU DOWBOR
– ON 22/09/2016
Publicado em outraspalavras.net

Foto: Offterdinger, photo by Harke • Public domain

Fraudes. Propinas para políticos. Manipulações. Um estudo devastador sobre o sistema financeiro revela como, por trás dos anúncios cheios de pessoas felizes, os bancos sugam a riqueza social

Por Ladislau Dowbor


Resenha do artigo:
Overcharged: the high cost of high finance
de Gerald Epstein e Juan Antonio Montecino, The Roosevelt Institute, Junho de 2016

Às vezes precisamos de um espelho. Com o grau de deformação ideológica dos argumentos quando se trata da realidade brasileira, é bom dar uma olhada como todo o debate sobre o resgate do sistema financeiro está se dando no resto do mundo. Não somos uma ilha, e muito menos o nosso sistema financeiro, ainda que aqui algumas deformações sejam muito maiores. Hoje já não podemos ignorar o sólido acervo de pesquisas, que deslancharam após a crise de 2008, e que mostram a que ponto o sistema financeiro se distanciou dos seus objetivos iniciais de financiar o investimento e o crescimento econômico. Aqui apresentamos a excelente pesquisa de Epstein e Montecino sobre o sistema americano, organizando as ideias chave, e este espelho gera um impressionante efeito de ver na imagem refletida a sombra dos nossos dramas.

O estudo de Epstein e Montecino oferece uma visão de conjunto do impacto econômico da intermediação financeira, tal como funciona nos EUA. O sistema não só não fomenta a economia, como a drena. O título, Cobrando demais: o alto custo da alta finança, já diz tudo, e pela primeira vez temos aqui uma visão sistêmica e integrada do quanto custa à economia americana uma máquina financeira que se agigantou e se deformou radicalmente. Hoje não fomenta a economia, pelo contrário, inibe-a, gerando mais custos do que estímulo produtivo. A pesquisa faz parte de um conjunto de iniciativas do Roosevelt Institute, que tem como economista chefe Joseph Stiglitz, prêmio “Nobel” de economia, e que já foi economista chefe do governo Clinton e do Banco Mundial.

Esta pesquisa tem muita importância para nós no Brasil, pois o sistema financeiro internacional funciona aqui a pleno vapor, e a cultura da intermediação financeira não varia muito entre a City de Londres, Wall Street ou o sistema de usura que se implantou no Brasil. Hoje existe uma cultura financeira global. No nosso caso, o desajuste fica evidente quando constatamos que em 2015 o PIB recuou de 3,8%, enquanto no mesmo período o lucro declarado do Bradesco aumentou em 25,9%, e o do Itaú aumentou em 30,2%. A máquina financeira está vivendo às custas da economia real. Nosso sistema de intermediação financeira não serve a economia, dela se serve. É produtividade líquida negativa. Ajuda, e dá confiança às nossas pesquisas aqui no Brasil, esta constatação lapidar do próprio Stiglitz: “Enquanto antes as finanças constituíam um mecanismo para colocar dinheiro nas empresas, agora funcionam para extrair dinheiro delas.”i

Há pessoas que têm dificuldade em imaginar um grande banco internacional achacando os seus clientes, e imaginam que nos EUA as coisas seriam sérias, quanto mais na Europa. É preciso aqui lembrar algumas coisas óbvias. Por fraude com milhões de clientes, o Deutsche Bank foi condenado em setembro de 2016, pela justiça americana, a uma multa de 14 bilhões de dólares (uma vez e meia o orçamento anual do Bolsa Família, que tirou 50 milhões de pessoas da miséria, só para dar uma ordem de grandeza dos tamanhos das fraudes bancárias). É bom lembrar que um banco tão sério como Citigroup já foi condenado a pagar US$ 12 bilhões (fechou por US$ 7 bilhões), Goldman Sachs está pagando $ 5,06 bilhões, JPMorgan Chase&Co está pagando US$ 13 bilhões, o Bank of America US$ 16,7 bilhões. Os crimes são dos mais diversos tipos, desde fraude nas informações aos clientes até falsificações dos mais diversos tipos, depenando clientes, enganando o fisco, falsificando informações sobre taxas de juros e semelhantes.ii

Todos ouviram falar da financeirização, mas poucos se dão conta da profundidade da deformação generalizada dos processos econômicos, sociais e ambientais que resultam da migração dos nossos recursos do fomento econômico através de investimentos, para ganhos improdutivos através de aplicações financeiras. Inclusive, os bancos e a mídia chamam tudo de “investimento”, parece mais nobre do que aplicação financeira ou especulação. A revista Economist até inventou a expressão “speculative investors” e Stiglitz sente-se obrigado a se referir a “productive invesments” para diferenciar. Mas não há como escapar desta realidade simples: quando você compra papéis, eles podem render, mas você não produziu nada. E abrir uma empresa, contratar trabalhadores, produzir e pagar impostos é mais trabalhoso do que por exemplo aplicar em papéis da dívida pública. O primeiro estimula a economia, o segundo gera rendimentos sem contrapartida, e a partir de um certo nível torna-se um peso morto sobre as atividades econômicas em geral.

Voltando ao artigo de Epstein e Montecino, em termos de funcionalidade econômica os autores se referem a uma “spectacular failure”: “Um sistema financeiro saudável é aquele que canaliza recursos financeiros para investimento produtivo, ajuda as famílias a poupar para poder financiar grandes despesas tais como educação superior e aposentadorias, fornece produtos tais como seguros para ajudar a reduzir riscos, cria suficiente quantidade de liquidez útil, gere um mecanismo eficiente de pagamentos, e gera inovações financeiras para fazer todas estas coisas úteis de forma mais barata e efetiva. Todas estas funções são cruciais para uma economia de mercado estável e produtiva. Mas depois de décadas de desregulação, o sistema financeiro atual dos EUA se tornou um sistema altamente especulativo que falhou de maneira bastante espetacular em realizar estas tarefas críticas.”(1)

Do lado das alternativas, é resgatar o sistema de regulação, reestruturar o sistema para que sirva a economia e não dela se sirva apenas, e gerar sistemas alternativos de intermediação financeira para que as pessoas voltem a poder ter escolha: “Esses custos excessivos das finanças podem ser reduzidos e o setor financeiro pode de novo jogar um papel mais produtivo na sociedade. Para alcançá-lo, precisamos de três enfoques complementares: melhorar a regulação financeira, aproveitando o que a [lei] Dodd-Frank já conseguiu; uma reestruturação do sistema financeiro para que sirva melhor as necessidades das nossas comunidades, pequenos negócios, famílias, e entidades públicas; e alternativas financeira públicas, tais como bancos cooperativos e bancos especializados, para equilibrar o jogo.” (3)

Como foi se deformando o sistema financeiro, que atualmente impõe enormes custos para a economia real, obrigada a sustentar uma imensa superestrutura especulativa? “Mostramos como a indústria de gestão de recursos (assets) cobra taxas excessivas e traz retornos medíocres para as famílias que buscam poupar para a aposentadoria; como empresas privadas de gestão de ações se apropriam de níveis excessivos de pagamentos dos fundos de pensão e outros investidores enquanto frequentemente penalizam os salários e oportunidades de emprego dos trabalhadores nas empresas que compram; como os fundos especulativos (hedge funds) apresentam mau desempenho; e como emprestadores predatórios exploram algumas das pessoas mais vulneráveis da nossa sociedade. Olhando desta maneira desde abaixo, podemos ver de forma mais clara como os níveis de excessos de cobrança (overcharging) que identificamos no nível macro se organizam de maneira prática.” (3)

O resultado prático é que os trilhões de dólares captados pelo sistema de intermediação financeira e os diversos fundos representam em termos líquidos um dreno para a economia americana. Este sistema, como no Brasil, representa uma produtividade negativa, e gera ganhos líquidos sem contrapartida produtiva correspondente: “Assim, as finanças têm operado nestes últimos anos um jogo de soma negativa. Isto significa que nos custa mais do que um dólar transferir um dólar de riqueza para os financistas – significativamente mais. Por isso, mesmo que você pense que os nossos financistas merecem cada centavo que conseguem, sairia muito mais barato simplesmente enviar-lhes um cheque todo ano do que deixá-los continuar a tocar os negócios como sempre.”(4)

Bancos pequenos e médios nos EUA continuaram a desempenhar as suas atividades de commercial banking, mas dez gigantes passaram a dominar o sistema financeiro, concentrando-se em outros produtos, essencialmente especulativos. Este grupo dominante, segundo a pesquisa, concentrou-se “em novos produtos e práticas ligadas à crise financeira – inclusive securitização, derivativos e comércio proprietário (proprietary trading), tudo financiado por empréstimos de muito curto prazo.”(10) A oligopolização é aqui central, apoiada não só na não-transparência dos produtos, como no seu poder político de obter subsídios (o que, no Brasil, a taxa Selic elevada). Trata-se “do poder monopolístico ou oligopolístico que as instituições financeiras podiam exercer por meio de produtos financeiros não transparentes, bem como da facilidade de acesso a volumes maciços de capital por causa dos subsídios devidos à sua condição de ‘grandes demais para quebrar’”.(19)

Segundo os autores, os numerosos bancos menores nos EUA terminam sendo tributários destes gigantes: “Os grandes bancos de Wall Street estão no epicentro do sistema financeiro. Como resultado, praticamente todos os aspectos dominantes das finanças que discutimos até aqui – hedge funds, ativos privados, créditos predatórios, mercado hipotecário e o chamado sistema de ‘bancos das sombras’ (shadow banking) – todos estão ligados até certo ponto com os grandes ‘core banks’.” Por sua vez, estes grandes bancos passam a exercer um poder político que torna qualquer reforma pouco viável: “No caso da reforma financeira, o poder que o setor financeiro exerce sobre o processo político tem sido uma força com a qual é difícil lidar.”(41)

Esta pirâmide de poder, tanto sobre o conjunto do sistema financeiro, envolvendo até os pequenos bancos comerciais locais ou regionais, como sobre o processo decisório político que deveria permitir a regulação, permitiu a estruturação de uma máquina que extrai recursos da economia de maneira desproporcional relativamente ao seu aporte produtivo. “Precisamos enfatizar o fato que na nossa análise, estamos estimando os custos líquidos (ênfase dos autores) do nosso sistema financeiro: os custos que ultrapassam de longe o que um sistema financeiro eficiente deveria custar à sociedade. As rentas financeiras medem quanto a mais os clientes e pessoas que pagam impostos têm de pagar aos banqueiros para ter direito aos serviços (benefícios) que recebem. Os custos de má alocação medem os custos de termos um crescimento econômico menor do que teríamos se as finanças tivessem uma dimensão otimizada e funcionassem de maneira eficiente. Estes custos são líquidos no sentido de que o cálculo reconhece que o sistema financeiro cria benefícios significativos, mas que estes benefícios seriam maiores se o sistema operasse em escala correta e de maneira correta. Finalmente, os custos da crise financeira constituem um custo líquido no sentido de que medem quanta produção foi perdida relativamente ao que seria possível se não tivéssemos tido a crise financeira.”(14)

O conceito de custo líquido do sistema financeiro é muito útil, pois envolve diretamente a questão da produtividade sistêmica das finanças de um país. Para o Brasil, considerando os custos da crise 2015/2016, da qual o sistema financeiro foi a causa principal, podemos igualmente calcular o custo sistêmico. No caso americano, os autores consideram que “precisamos incorporar os custos das crises financeiras associadas com a especulação excessiva e as atividades econômicas destrutivas que são agora bem compreendidas, no sentido de terem sido chave na crise econômica recente.” (16) A diferença é que nos EUA se reconhece as raízes da crise financeira de 2008, enquanto aqui se atribui a crise ao ridículo déficit fiscal, de menos de 2% do PIB. O rombo na realidade é criado pelo nível surrealista de juros sobre a dívida pública, a taxa Selic, que só no ano de 2015 significou uma transferência de 501 bilhões de reais, 9% do PIB, dos nossos impostos para os grupos financeiros.iii

O conceito de renta financeira (financial rent) é importante, e o próprio conceito de “renta”, diferente de renda, tem de ser introduzido nas nossas análises no Brasil. O fato é que a “renta” como forma de acesso aos recursos sem a contribuição produtiva correspondente ajuda a entender o processo (no Brasil, curiosamente, utilizamos a expressão “rentismo” mas não existe ainda o conceito de “renta”). Em inglês se distingue claramente o mecanismo produtivo que gera a renda (income) e a aplicação financeira que gera “renta” (rent). Em francês é igualmente clara a diferença de “revenu” e “rente”, respectivamente. Não há como entender por exemplo os trabalhos do Piketty sem esta distinção. Segundo os autores, “no caso das finanças modernas, as rentas vêm em duas formas básicas: uma é o pagamento excessivo feito aos banqueiros – top traders, CEOs, engenheiros financeiros e outros empregados de bancos e outras instituições financeiras com altas remunerações; a outra forma são os lucros excessivos, ou retornos muito acima dos retornos de longo prazo que são distribuídos aos acionistas como resultado dos serviços financeiros providenciados por uma empresa.” Os ganhos financeiros deste tipo agigantam-se a partir dos anos 1990. (17, 19)

Os custos destas atividades rentistas que travam as atividades econômicas em vez de promovê-las, têm de ser suportados pela sociedade: “O custo das finanças para a sociedade não é apenas o resultado de transferências de renda e riqueza da sociedade como um todo para as finanças; há custos adicionais se a mesma finança mina a saúde da economia para as famílias e os trabalhadores.”(22) Uma citação interessante trazida pelos autores é a de James Tobin, já em 1984: “Estamos jogando um volume cada vez maior dos nossos recursos, inclusive a nata da nossa juventude, em atividades financeiras distantes da produção de bens e serviços, em atividades que geram retornos privados elevados sem proporção com a sua produtividade social.”

Tobin foi um dos primeiros a constatar esta deformação sistêmica da intermediação financeira.(23) Tenho encontrado esta citação em outros textos, pois é muito relevante, inclusive pelo uso do conceito de “produtividade social”, ou seja, utilidade para a economia e a sociedade em geral, e não apenas para o banco ou outro grupo que desempenha uma atividade. O conceito de SROI – Social Return on Investment – começa também a ser utilizado mais amplamente. No nível pessoal, inclusive, muitos profissionais começam a se perguntar se, independentemente de quanto ganham, a atividade que desempenham é socialmente útil. E quando é claramente nociva, surgem as contradições e as crises existenciais, como estudado por exemplo no excelente Swimming with Sharks, de Luyendijk, focando os altos funcionários da City de Londres.iv Não são aqui divagações filosóficas, as pessoas querem cada vez mais que os seus esforços façam sentido.

A realidade é que o desvio dos recursos das atividades produtivas para ganhos especulativos trava o conjunto da economia, mas a indignação fica restrita pela simples razão que o sistema é extremamente opaco. Os autores aqui são conscientes desta dificuldade, e aproveitam para mostrar que diversas pesquisas sobre os sistemas financeiros convergem pra as mesmas conclusões: “Os sistemas financeiros privados de maiores dimensões podem ser associados com ‘finanças especulativas’, trading em maior escala, e um setor pouco associado ao fornecimento de crédito à ‘economia real’. Como argumenta Stiglitz, estes sistemas financeiros podem se orientar para a extração de recursos da economia real, e não para colocar mais recursos na economia real (ver também Mason, 2015). Este tipo de sistema financeiro pode muito bem se orientar para investimentos de curto prazo (Haldane, 2011) e empregar o que William Lazonick chama de estratégia de “desinvestir e distribuir” em vez de “reter e reinvestir”, o que significa que mais recursos são extraídos das empresas não-financeiras. Esta orientação deve também reduzir o crescimento da produtividade e o investimento, e em consequência o crescimento econômico.”(23)

O texto de Mason mencionado, também excelente leitura, constata que “as finanças já não são um instrumento para colocar dinheiro em empresas produtivas, mas em vez disto para delas tirar dinheiro.”(3) Segundo o autor, nos anos 1960 e 1970 cada dólar de ganhos e crédito suplementares levava a um aumento de investimentos da ordem de 40 cents. Desde os anos 1980 leva a um aumento de apenas 10 cents. É uma mudança radical em termos de produtividade das aplicações financeiras. Segundo Mason, “isto resulta de mudanças legais, administrativas e estruturais que são a consequência da revolução dos detentores de ações nos anos 1980. No modelo administrativo anterior, mais dinheiro que entra numa empresa – por vendas ou por crédito – tipicamente significava mais dinheiro colocado em investimento fixo. No novo modelo dominado pelo rentismo, mais dinheiro que entra significa mais dinheiro saindo para as mãos de detentores de ações sob forma de dividendos e recompra de ações.”(Mason,1)v Como os dividendos são pouco taxados pelo sistema tributário – o que foi conseguido pela capacidade de pressão política – o círculo da financeirização e da riqueza não produtiva se fecha.

O novo sistema de intermediação financeira gerou também uma massa de advogados, conselheiros, contadores, gestores de fundos e semelhantes, todos ávidos maximizar os retornos e os bônus correspondentes. “Os serviços de gestão de riqueza cresceram de um universo de 51 empresas administrando US$ 4 bilhões, em 1940, para mais de US$63 trilhões em riqueza (assets) com mais de 11 mil consultores e quase 10 mil fundos mútuos registrados com o SEC em 2014”. (41) Para efeitos de comparação, lembremos que o PIB mundial de 2014 é da ordem de US$ 75 trilhões. Esta massa de profissionais gerou por sua vez um cluster importante de poder, com forte influência, em particular, no conjunto da comunicação financeira na grande mídia, que apresenta quase que exclusivamente a visão dos interesses dos grandes grupos financeiros.

No nosso caso brasileiro não dispomos de estudos correspondentes sobre a estrutura de intermediação e de poder político que estes interesses geram, capaz de atropelar qualquer tentativa de reduzir os seus lucros. Mas é evidente que quando o governo Dilma tentou reduzir os juros absurdos (tanto sobre a dívida pública como para pessoas jurídicas e pessoas físicas) em 2013, partiram para a guerra total. O fato é que o mundo financeiro e os rentistas reagiram em bloco, movimento por sua vez aproveitado por diversas esferas de oportunismo político. O paralelo com os Estados Unidos é neste sentido interessante, quando se viu os imensos recursos públicos que o governo transferiu para os bancos a partir de 2008. Não é só aqui que o sistema financeiro se tornou a força política maior.

Como foi que chegamos a este nível de deformação do sistema financeiro, que já foi tão essencial para os processos produtivos e hoje os trava? Os autores identificam cinco mecanismos: “Como no caso da maior parte das finanças, as chaves para rentas excessivas obtidas pelas empresas financeiras e traders são: 1) a opacidade, frequentemente criada de maneira deliberada, por meio de excesso de complexidade, falta de transparência (disclosure), ou mais diretamente informação enganosa que é facilitada pelo frágil marco regulatório; 2) elevada concentração do mercado dentro de linhas específicas de negócios levando a que haja pouco competição; 3) subsídios governamentais de vários tipos, inclusive resgates (bailouts), impostos subsidiados, facilidade nas regras contábeis, e vantagens legais criadas por arranjos legislativos, administrativos ou legais; 4) retirada de provisões públicas que geram um mercado aberto para as finanças e torna a população vulnerável a todos esses canais com excessos de renda e de retornos; 5) regulamentação fiduciária fraca que permite que floresçam conflitos de interesses.”(35)

A parte de baixo da sociedade é a que sustenta o maior choque desta reorganização:

“As famílias recebem informações falsas e caras por parte de conselheiros que têm um incentivo para enganar (mislead) e que podem fazê-lo graças a um ambiente legal e regulatório permissivo.” (36) Isto por sua vez gera o aprofundamento das desigualdades: “Práticas e rendimentos financeiros têm contribuído muito para a desigualdade de renda e de riqueza nos EUA nas recentes décadas. Além disso, algumas práticas financeiras contribuem para a criação e manutenção da pobreza. Em nenhum lugar estas conexões entre finanças, desigualdade e pobreza são mais aparentes do que na provisão de serviços bancários para os pobres e para famílias em dificuldades financeiras.”(40) Aqui, o paralelo com os juros extorsivos nos crediários e nos bancos no Brasil é evidente, sendo que no nosso caso, com juros de três dígitos, as distorções são simplesmente muito mais escandalosas.

Para os autores, a necessidade de uma profunda reorganização do sistema financeiro torna-se óbvia: “De forma geral, para enfrentar as questões aqui levantadas, referentes aos enormes custos do nosso sistema financeiro corrente, precisamos de três abordagens complementares: regulação financeira, reconstrução financeira, e alternativas financeiras…Para atingir estes objetivos, precisaremos provavelmente de uma nova lei Glass-Steagall para eliminar a rede de segurança social de que gozam as atividades financeiras altamente especulativas, limites mais estritos quanto à alavancagem e tamanho dos bancos de forma a dividir (break up) as instituições financeiras maiores e mais perigosas, e uma regulação mais rigorosa para limitar quanto se paga por estas atividades de alto risco.”(43/43)

E temos a consequente reformulação dos objetivos do sistema financeiro, para que volte a ser útil (e não mais prejudicial) para a economia e para a sociedade: “Nosso sistema financeiro precisa ser reestruturado de forma que sirva melhor as necessidades das nossas comunidades, pequenos negócios, famílias, e entidades públicas, tais como municípios e estados. Eliminar os subsídios dos bancos ‘grandes demais para quebrar’ ajudará a abrir espaço para instituições financeiras menores e mais orientadas para as necessidades das comunidades; no entanto, é pouco provável que isto permita gerar um número suficiente de instituições financeiras para apoiar as necessidades das nossas comunidades. Como resultado, é provável que necessitemos de um número maior de alternativas financeiras: bancos públicos, bancos cooperativos, e bancos especializados tais como os green banks e bancos para infraestruturas”.(43)

Os avanços deste tipo de pesquisas nos Estados Unidos reforçam a necessidade de procedermos ao estudo do fluxo financeiro integrado no Brasil, buscando o resgate da função econômica da intermediação financeira nas suas diversas dimensões.


i Stiglitz, Rewriting the Rules of the American Economy, pode ser encontrado na íntegra em http://dowbor.org/blog/wp-content/uploads/2015/06/report-stiglitz.pdf

ii O Guardian de 16 de setembro de 2016 traz um pequeno resumo, veja aqui ; no Financial Times é assunto cotidiano, como por exemplo é o caso de manipulações atingindo 2 milhões de clientes por parte do banco Wells Fargo, noticiado na edição de 20/09/2016 do FT e reproduzido no Guardian da mesma data.

iii Ver o nosso estudo correspondente do sistema financeiro no Brasil, em Resgatando o potencial financeiro do país: http://dowbor.org/2016/08/ladislau-dowbor-resgatando-o-potencial-financeiro-do-pais-versao-atualizada-em-04082016-agosto-2016-47p.html/ .

iv Joris Luyendijk – Swimming with sharks – Guardian Books, London, 2015 http://www.theguardian.com/business/2015/sep/30/how-the-banks-ignored-lessons-of-crash

v J.W. Mason –Disgorge the Cash – Roosevelt Institute, 2015 – http://rooseveltinstitute.org/wp-content/uploads/2015/09/Disgorge-the-Cash.pdf

Deltan Dallagnol escolhe arregimentar seguidores em vez de informar cidadãos

Compartilho texto de Eliane Brum, publicado no El pais.

Mais uma opinião bem fundamentada sobre as irregularidades praticadas pelos procuradores da Lava Jato e órgãos do judiciário que resolveram adotar teses exdrúxulas e recursos apelativos midiáticos para pré-condenar suspeitos e investigados.

Já publicamos diversos artigos, todos muito bem fundamentados, demonstrando a ilegalidade e o desvio ético nos métodos jurídicos aceitos e praticados no Brasil. Vamos continuar questionando e publicando, sem abrir mãos de textos bem fundamentados.

Paulo Martins

 

http://brasil.elpais.com/brasil/2016/09/26/opinion/1474905644_588160.html?id_externo_rsoc=TW_CC

Não ser medíocre será um castigo

Compartilho texto de Francisco Costa, publicado em seu facebook.

NÃO SER MEDÍOCRE SERÁ UM CASTIGO

Para a maioria dos menores de 40 anos, que não conheceu um outro país, vai tudo bem, tudo normal, mas para os que nasceram num tempo em que se pensava, em que o país se pensava, o Brasil vai se transformando rapidamente no túmulo do pensamento, da razão.

De um lado o fundamentalismo religioso destruindo as nossas raízes.

De repente o samba, a congada, o bumba meu boi, o reizado, o cavalo marinho, frevo, maracatu… Viraram manifestações diabólicas.
As festas juninas, sacrilégio e idolatria.

Se no plano cultural, folclórico, é esta devastação, no plano científico o estrago não é menor, a ponto de idiotas pleitearem introduzir o criacionismo nos currículos escolares e acadêmicos, algo assim como introduzir a crença em cegonha nos cursos de Ginecologia e Obstetrícia.

Observando os candidatos a vereadores e prefeitos, diante de alguns Tiririca é Doutor em Física Quântica e Bolsonaro é a Madre Teresa de Calcutá, figuras risíveis pedindo votos na televisão;
Ressurgem e com muita força o racismo, a xenofobia, o preconceito de classe, paradoxalmente defendido pelos pobres.
Para coroar tudo, uma reforma do ensino médio de arrepiar analfabetos.

Explico: a ciência, hoje, faz uma abordagem holística da realidade, onde as matérias curriculares existem apenas como forma de ordenar o conhecimento, porque nenhum assunto se esgota em si, interdependendo-se.

Por exemplo: houve uma época em que um médico era um anatomista (conhecia a localização e funcionamento dos órgãos) e um farmacologista, conhecendo as substâncias que atuam sobre o organismo humano, e ponto final.

Hoje, a tecnologia invadiu de uma tal maneira a área médica que o médico moderno é um técnico em eletrônica, um físico e químico, também, para dominar o uso de todo o equipamento do setor.
Um biólogo, que no passado era um compilador de nomes científicos, um identificador de espécies, hoje, graças ao domínio da Ecologia e do conhecimento dos mecanismos da Evolução, um biólogo é também edafólogo (solos), bioquímico, biofísico, meteorologista, geógrafo…
Não há mais o especialista, pelo conceito antigo, aquele cara que entendia muito de muito pouco.

Num quadro assim, buscar especializações no ensino médio é fatiar o saber, desde a base, e logo teremos médicos incapazes de redigir um diagnóstico, engenheiros incapazes de redigir um laudo, advogados incapazes de redigir uma petição, todos analfabetos funcionais, porque do português só uma vaga lembrança do que estudaram no curso fundamental.

Num tempo em que as informações nos chegam num ritmo avassalador, abrir mão da cultura geral, de pelo menos as noções básicas em cada campo dos conhecimentos é tornar-se um robô na linha de produção.

Como viver na era atômica sem saber o que é um átomo, de viagens siderais, sem ter pelo menos noção do Sistema Solar, sem conhecer pelo menos os rudimentos de anatomia, para conhecer o próprio corpo, ter noções mínimas de conceitos políticos e sociológicos, para não ser caixa de ressonância de mais espertos?

Quanto mais assuntos um homem domina maior a sua capacidade de análise e crítica, melhor entende e se situa no mundo, ao contrário dos iletrados analfabetos funcionais.
Normalmente o analfabeto funcional é monoideísta, vive de idéia única.

Repare que para muitos está tudo num livro considerado sagrado, tudo se resolve e se resolverá por intervenção divina; para outros, fazer política é apontar os corruptos adversários e defender os seus corruptos; os cuja única preocupação é a vida alheia…
É por demais sabido que os sem informações discutem pessoas, os medianamente informados discutem fatos e os bem informados discutem idéias.

Mas na contramão desses conceitos elementares o governo pretende fatiar os conhecimentos e dar uma fatia, somente uma, a cada brasileiro, a partir do ensino médio.

O filósofo Friederich Nietzche afirmou que “sou humano e nada do que é humano me pode ser indiferente”.

Os neoliberais gênios brasileiros caminham em direção oposta, o que pode ser resumido por “sou brasileiro e nada devo pensar, só trabalhar”.

Francisco Costa
Rio, 29/09/2016.

“Lava Jato atacou e destruiu as bases do direito brasileiro”, diz Jessé Souza

“Lava Jato atacou e destruiu as bases do direito brasileiro”, diz Jessé Souza
MARCELO COELHO, Folha de São Paulo

27/09/2016 16h04
Professor da Universidade Federal Fluminense, com doutorado em Heidelberg, na Alemanha, e pós-doutorado na New School for Social Research, nos Estados Unidos, o sociólogo Jessé Souza, 56, acaba de publicar “A Radiografia do Golpe” (Leya), livro em que condena as articulações que levaram ao afastamento de Dilma Rousseff. Em entrevista ao colunista da Folha Marcelo Coelho, ele apresenta os pontos principais de sua análise.

*

Folha – Que fatores, a seu ver, determinaram o afastamento de Dilma Rousseff?

Em primeiro lugar, os interesses na manutenção de um rentismo perverso, que significa uma rapina sobre o resto da sociedade em benefício de poucos. A presidenta decidiu atacar o rentismo reduzindo os juros. Quis romper a política de compromisso de Lula e perdeu a batalha.

A partir daí, a elite econômica –com seus dois braços, o Congresso comprado e a grande imprensa sócia da rapina– criou uma base social conservadora junto à fração da alta classe média, parte dela com interesses no rentismo e outra parte receosa com a ascensão social dos pobres. Apropriou-se da narrativa das “jornadas de Junho”, distorcendo o sentido das manifestações e federalizando pautas locais.

Essa foi uma das principais novidades em relação ao mensalão: uma fração social desde sempre conservadora e sempre vencida no voto, foi apresentada pela manipulação televisiva como o “povo nas ruas”.

A outra novidade foi a cooptação da fração corporativa do aparato jurídico-policial do Estado. Uma casta com altos salários e vantagens que fogem da transparência, e se acredita acima da sociedade, adorou posar de guardiã da moralidade, aumentando seus privilégios e colonizando a agenda do Estado no sentido da restrição dos direitos individuais para aumentar ainda mais seu próprio poder.

Foram esses quatro elementos conjugados que articularam o golpe. As contradições entre eles tendem a ocorrer a partir de agora.

Como explicar o impeachment de um presidente claramente identificado com propostas neoliberais, como Fernando Collor?

Sim, as condições históricas eram outras e acredito que Collor seja um ponto fora da curva: um presidente patologicamente narcísico sem nenhuma credibilidade e que era percebido pelo público como mero assaltante dos recursos do Estado. Todos os “golpes” –Getúlio, Jango e Dilma– tiveram, entretanto, o sentido de restaurar a regra de que este é um país para poucos e onde o dinheiro compra tudo.

A deterioração do quadro econômico, durante o governo Dilma, não teve peso em sua queda de popularidade?

Tem gente que acredita naquela frase “é a economia, tolinho” como elemento definidor da política. No entanto, “tolinho” é quem acredita que a economia enquanto tal decida alguma coisa. Toda crise econômica precisa ser interpretada e é sua interpretação –no nosso caso a que se torna vitoriosa em um contexto de distorção sistemática da informação– que permitiu a percepção da crise como causada unicamente pela presidenta.

Na realidade, a crise fiscal tem a ver com a captura do Estado pela elite financeira que compra o Congresso e a política para que sua riqueza não seja taxada e ainda força o Estado a “pedir emprestado” via dívida pública –ou seja, nós todos que somos feitos de tolos que pagamos a conta– aquilo que a evasão fiscal retira da sociedade como um todo.

Como 90% dos analistas econômicos representam esses mesmos interesses rentistas, a “interpretação” dominante de temas complexos para o público tende a ser pervertida de fio a pavio.

Você afirma no livro que a “agenda da moralidade” no Brasil foi construída paulatinamente para rebater a agenda do combate à desigualdade. Mas, durante os governos Sarney, Collor e Fernando Henrique, nenhum partido bateu mais na tecla da moralidade do que o PT.

Eu critico no livro tanto a direita quanto a esquerda. Nossa esquerda sempre foi colonizada pelo discurso de falso moralismo da direita. Não à toa Sergio Buarque e Raymundo Faoro, baluartes do moralismo conservador, são heróis da esquerda. O PT ajudou a criar as instituições sem controle hoje em dia. Uma monstruosidade jurídica que hoje persegue e criminaliza até mesmo a liberdade de expressão.

Partiu dos juízes do Supremo Tribunal Federal a proibição de financiamento corporativo a campanhas eleitorais. A Igreja, com seu poder de arregimentação popular, foi importante na aprovação da Lei da Ficha Limpa. Como explicar que esses passos para a reforma política tenham sido dados, enquanto os governos petistas foram incapazes de liderar tal processo?

O PT era, no governo, um partido minoritário que sempre defendeu o financiamento público e sempre foi derrotado no Congresso cuja imensa maioria havia sido comprada via financiamento privado. Os erros do partido me parecem residir em outro lugar: deveria ter combatido o corporativismo nefasto das corporações jurídico-policiais e deveria ter contribuído para uma imprensa mais plural.

Seu livro se refere constantemente aos “donos do dinheiro”, ao “1% mais rico”, à “elite do dinheiro”. O conceito não perderia algumas nuances? Enquanto o setor industrial, representado pela Fiesp, aderia abertamente ao impeachment, líderes do setor financeiro, como os presidentes do Bradesco e do Itaú, declararam-se contrários ao afastamento de Dilma. O atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi presidente do Banco Central no governo Lula, e no seu segundo mandato, com amplo apoio da imprensa, Dilma nomeou Joaquim Levy para a Fazenda…

O Bradesco nomear o ministro da Fazenda não significa apoio, mas, sim aproveitar a chance de “exercer diretamente” a política econômica de um governo acuado. Consistia em ajuste fiscal para a educação e saúde da população e liberdade para juros gordos para a meia dúzia que manda em tudo. Essa é política econômica imposta a Dilma –que resistiu depois– e que foi derrubada para que tenhamos esse mesmo projeto agora sem resistência alguma. De resto, a união entre todas as frações da elite econômica advém do fato de que todos eles confiam seus ganhos ao rentismo e aos ganhos pelos juros estratosféricos.

Na formulação clássica do conceito de populismo, pensava-se na presença de um líder providencial, capaz de representar os pobres e redistribuir renda por ato de vontade política… Embutida nessa crítica, estava a ideia de que tal estratégia minimizava o papel da auto-organização das classes populares e da formação de um partido político sólido. A distribuição de renda surgia como um favor, embalado na simbologia de uma representação que no fundo não era democrática nem participativa. Você não acha que o petismo, ao se transformar em lulismo, sofreu desse problema?

O conceito de populismo tem algo de extremamente conservador e ridículo. O ridículo é chamar qualquer ajuda à maioria de abandonados e de trabalhadores super-explorados –cerca de 70% da população brasileira– de populismo. Nesse caso, democrático seria, por pura exclusão lógica, atender aos interesses da ínfima elite.

O conservadorismo é imaginar que existam classes conscientes de seus interesses o tempo todo. Se nossas classes médias –que efetivamente poderiam ser mais inteligentes do que são– são feitas de tolas todo dia pelas doses diárias de veneno midiático, imaginemos as classes abandonadas que não têm defesa cognitiva possível a esse tipo de ataque a não ser o racionalismo prático do dia a dia que a fazem escolher os líderes que efetivamente melhoram seu bem estar concreto e aumentam suas chances de vida.

A única classe “consciente de si” entre nós é a elite da rapina. Seus braços econômicos, políticos, midiáticos e jurídicos se uniram maravilhosamente quando perceberam a chance do golpe em benefício próprio.

Na atual crise, deu-se o fato inédito de a Operação Lava Jato ter levado à cadeia alguns dos empresários mais poderosos do país, como Marcelo Odebrecht. Isso não representa uma virada importante, aumentando o prestígio de um juiz como Sérgio Moro?

A crença na Lava Jato como instância purificadora de nossa realidade é a maior fraude de todo esse processo que vivemos. Fraude construída por manipulação midiática.

Primeiro, escolheu-se dar toda a ênfase à narrativa do PT como “organização criminosa” como se a corrupção política a serviço do mercado não fosse sistêmica e não abrangesse todos os partidos e todos os níveis da administração. Aliado a isso o “timing” da operação e seus vazamentos ilegais se casou perfeitamente com o golpe parlamentar lhe dando narrativa e justificação. Alguém com mais de cinco anos acredita em coincidências e papai Noel?

Segundo, não se constrói nenhuma realidade jurídica nova minando as bases do direito que são as garantias individuais e o processo legal formal. Nada atacou e destruiu tanto as bases do direito brasileiro quanto a Lava Jato. Houve uma “des-diferenciação” do direito que se politizou e regrediu historicamente perdendo sua autonomia.

Depois não é próprio da ação jurídica, que é restrita ao seu escopo de garantir direitos violados, a tarefa de reformulação social. Essa é a tarefa da política.

O vazamento das conversas entre o empresário Sergio Machado e Romero Jucá, nos quais se cogitava de meios para abafar a Operação Lava Jato, é classificado por você como “seletivo”. Seria um artifício dos meios de comunicação para dar ilusão de imparcialidade? Na mesma linha, os jornais noticiam caixa dois na candidatura Serra e pagamentos solicitados por Temer à Odebrecht. É possível, pensando nestes exemplos, falar em “indignação seletiva” da mídia contra o PT?

Dois pontos são importantes esclarecer nesta questão. A imprensa, como o judiciário, não é uma coisa só. Existem conflitos importantes entre órgãos mais e menos isentos e existem também profissionais que se fazem respeitar e conquistam algum espaço de autonomia. A imprensa precisa da aparência de isenção e isso cria espaços alternativos importantes.

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O que a fração de imprensa mais conservadora e menos isenta fez –muito especialmente os oligopólios de TV– e faz foi tentar e efetivamente conseguir demonizar e criminalizar o discurso de esquerda –uma esquerda muito “light” diga-se de passagem– o que ela foi aprendendo a fazer cada vez melhor nos últimos anos. No entanto, seja para assaltar um banco, seja para assaltar a soberania popular, é sempre mais fácil achar aventureiros para a empreitada do que dividir o bolo. Na hora de dividir o butim do golpe é que surgem os conflitos. Essa é a fase em que estamos hoje. A luta de morte aqui é para salvar as aparências. Nem todos conseguirão.

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Osvaldo Ramos ontem às 16h53 Avaliar como positivo 1 Avaliar como negativo 1 Denunciar COMPARTILHAR
Destruiu sim as Chicanas e os Chicaneiros, as Protelacoes, e os Proteladores.
O comentário não representa a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem
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Grace Lima ontem às 19h45 Avaliar como positivo 1 Avaliar como negativo 2 Denunciar COMPARTILHAR
É uma vergonha alguém publicar esse absurdo. O próximo texto será de c omo o ET de Varginha saqueou os cofres públicos.
O comentário não representa a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem
Responder
Paulo Costa ontem às 16h59 Avaliar como positivo 1 Avaliar como negativo 3 Denunciar COMPARTILHAR
Trata se de absurdos apos absurdos mas a mente ultra marxista de jesse o alien, está devorada e impregnada por paradigmas desta ideologia. Este ai alem de fazer parte das idéias fazia também parte das tetas..
O comentário não representa a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem
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O chorume fascista

Você pode escolher o título deste artigo, escrito por Katarina Peixoto e compartilhado em seu Facebook. Compartilho texto já publicado por Vi o Mundo e pelo Conversa Afiada. Trata-se de texto excelente, merece leitura atenta até o fim e, se necessário, releitura. Escolhi este título, como poderia ter escolhido “metástase antilegalista” ou “A indigência intelectual e jurídica do país”, tendo em vista a gravidade da situação que enfrentamos.

Leia, adoeça e, no fim, se fortaleça para a luta, que será árdua.

Paulo Martins

Ontem dediquei algumas horas a ler decisões de juízes, desembargadores e ministros. Adoeci um pouco mais e espero conseguir fazer algo de positivo com o chorume que li.

Enunciados falsos podem fazer sentido. E nada há de trivial nisso. Um dos Diálogos platônicos de maturidade, O Sofista, é dedicado ao estatuto lógico dos enunciados falsos e sobre o passado (ou, mais precisamente, sobre o que não é). Desde O Sofista, avançamos na literatura secundária mas, como todo problema filosófico nos exige, não há uma solução para o estado do problema e, vale dizer, não deve haver. A filosofia não existe para resolver os problemas do verdadeiro e do falso, do que existe e do que não existe, mas para nos ajudar e entender e a descrever a natureza e o escopo desses problemas, inclusive na vida cotidiana. Inclusive frente ao poder político e ao direito.

Fui dormir com uma pergunta na cabeça: se um juiz ou desembargador brasileiro prescrever uma receita de ovo frito e, com base nela, autorizar a que se enjaule um cidadão antipático à opinião do Jornal Nacional e da Revista Veja, por que razão ele não estaria autorizado a fazê-lo?

Existe interpretação e há teorias da interpretação, as chamadas hermenêuticas. Existem distinções de método. Essas coisas não anulam e nunca anularão a ruptura entre o verdadeiro e o falso e, se o fizerem, nem são interpretação, nem hermenêutica, mas pilantragem, quando não, crime, caso envolvam violação documental e ideológica, tipificadas no código penal, ou o uso mal intencionado e vil de enunciados textuais, a fim de cometer atos sem amparo legal.

Há três casos de falsificação documental que extrapolam em muito a complacência estamental da hermenêutica jurídica e que dão a ver a seriedade dessa questão, acima.

Por ocasião da Ação 470, o caso do mensalão, um ministro do STF arregimentou e violou o sentido de uma doutrina, para produzir sua acusação. A chamada doutrina do “domínio do fato”, inventada e utilizada como mera arregimentação, é, em termos estritos, uma falsificação do que Roxxin produziu. Na sua versão brasileira, o que ocorreu foi mais grave, em termos lógicos e penais, do que uma dublagem: a arregimentação serviu para se inventar uma teoria penal da responsabilidade objetiva que não visa a, como manda a filosofia penal moderna e o direito penal brasileiro e a teoria do domínio do fato, segundo Roxxin, buscar a pessoa ou as pessoas de direito que cometeram o crime (com base na identificação particular, subjetiva, no encadeamento de responsabilidade diante de crimes de magnitude e escopo coletivo), mas a atribuir à peculiar noção de objetividade ali exposta, uma totalidade adhoc tal que configure um crime coletivo, por associação qua associação. É como o crime cometido por um cnpj, uma aberração semântica, jurídica, penal, processual penal, judicial e real.

Que uma mídia familiar oligárquica, sonegadora e vinculada a regimes de exceção e deles advogada permanente faça isso, não surpreende. Que isso entre para a jurisprudência brasileira é uma violação de sentido naquilo que define o que se passou a chamar de condições de sentido de um enunciado: as condições para que ele seja dito verdadeiro ou falso.

Ainda assim, essa arregimentação, na medida exata em que não passa disso, pode fazer algum sentido, como falsidade. O acusador sofista, aposentado após a prestação de seu serviço, ao menos se retirou de cena. Com pouca repercussão e nenhum acolhimento conceitual entre os bacharéis superassalariados, o próprio Roxxin disse sua teoria havia sido falsificada, quando em visita ao Brasil, num seminário, após ter se tornado célebre (infelizmente, não por ter sido predado).

Outra falsificação grotesca, também de escopo nocivo e corrosivo da vida institucional do país, foi cometida pelo juiz moro. Ele conseguiu transmutar a descrição, feita por Vannuci, o cientista político italiano, no célebre “O Fracasso da Operação Mãos Limpas”, segundo a qual a operação teria produzido uma “deslegitimação da política”, em prescrição. Num artigo cometido em revista especializada, cita o Vannuci para defender, vejam só o desvio além da hermenêutica: operações de combate à corrupção deveriam promover a deslegitimação da política.

Dizer que algo produziu a deslegitimação da política não é, por critério algum, dizer que algo deve produzir a deslegitimação da política. Pior: identificar ambos os enunciados ao citá-los como idênticos é falsificar o enunciado original.
A terceira falsificação escandalosa que autoriza a gravidade da questão acima, a respeito do ovo frito, foi cometida há muito pouco tempo, por desembargador federal, prontamente apoiada por uma maioria de falsificadores ou complacentes com a falsificação.

A propósito da análise de representação contra as violações, como tais reconhecidas pelo próprio TRF4, do juiz sergio moro, da Lei Orgânica da Magistratura, que veda o expediente delinquente de grampear advogados e violar a relação entre esses e seus clientes, os senhores desembargadores não somente arregimentaram um filósofo, como o fizeram por segunda mão, via Apud, de texto, inacreditavelmente, cometido por um ex-ministro do STF. O ex-ministro comete a inversão completa e falsificadora do sentido de “exceção jurídica” analisado pelo filósofo italiano Giorgio Agamben. Eros Grau preda o que diz Agamben e os senhores do TRF4, sem timidez nem respeito ao texto do Agamben, aliás com boa tradução para a língua portuguesa, e para a vergonha e a explicitação de um grau periculoso de indigência intelectual e jurídica que assola e ameaça as instituições do país, julgam válida a falsificação do sentido de “exceção jurídica” e usam uma falsificação para assegurar outra.

Trata-se de uma falsificação de segunda ordem, para escândalo de qualquer pessoa letrada. Essa falsificação é grave e nos leva a muitas questões, igualmente graves: se e quantos outros casos há, de falsificações gritantes de teorias, arregimentadas por juízes que não respondem pelo que fazem, não prestam contas a ninguém e, por isso, mandam para a cadeia e inviabilizam a vida de quem for?

Enganam-se os que pensam que isso vai parar ou que isso é só contra o PT e seus dirigentes. Essa ingenuidade não tem o menor cabimento, quando juízes não se envergonham de falsificar teorias, prender sem provas e dizendo que a falta de provas é motivo para prender.

Pode ser analfabetismo funcional, pode ser ignorância, pode ser miséria intelectual carregada do câncer atávico, residual, da cultura bacharelesca, de colônia escravagista. Há muitas hipóteses que exigem o acompanhamento judicioso do que juízes dizem que usam como fundamento de suas decisões e o que procuradores e promotores usam para fundamentar suas denúncias. Fico pensando se alguém que denega a existência pregressa dos dinossauros ou o legado epistêmico do darwinismo pode saber em que consiste uma relação de causalidade, de inferência e de probabilidade. Custo a crer, mas eu sou só uma doutora em filosofia, que se graduou em direito numa das melhores escolas do país, caracterizada, exatamente, por nos prevenir das metástases antilegalistas. Quanto a isso, sou grata.

Descrever algo é uma das coisas mais difíceis e também requer compromissos semânticos explícitos. Quando eu digo: “a teoria do domínio do fato é o modo de fritar ovos”, estou dizendo que essa teoria, não uma outra, é o modo, não nenhum outro, de fritar ovos.

Se esse não é o modo de fritar ovos, incorro em falsidade, isto é, enuncio algo falso, mesmo que possa fazer tanto sentido como um ou o modo x de fritar ovos.

Mas uma criança em idade escolar, antes da reforma do ensino médio imposta pelo subletrado da força de usurpação do MEC, pode distinguir sem problema algum entre “o modo de fritar ovos” e “o modo como se deve fritar ovos”. Uma criança saberá que essas frases e seus enunciados não são idênticos e que, portanto, identificá-las é errado.

De que natureza é esse erro? Um das coisas mais graves, além do fato melancólico e estarrecedor de que juízes podem mandar enjaular pessoas com base em falsificações feitas por eles mesmos, ou que podem autorizar um outro juiz a fazê-lo, com base em outras falsificações, feitas e cometidas em publicações sem filtro intelectual minimamente alfabetizado, é que esses servidores públicos recebem salários elevados sem que, para tanto, seja requerido mais do que a graduação em direito e, podemos inferir muito tranquilamente, concursos públicos com baixa exigência intelectual e cultural.

Eles não dão aulas em dois ou três expedientes, após doutorado e mestrado, recebendo bolsas simbólicas que mal compram livros e pagam passagens de ônibus. Eles não são obrigados a ler e escrever em mais de um idioma. Não são julgados por pares e pelos que dependem de seu trabalho, para se formarem. Eles não respondem a ninguém e vivem num estado orçamentário e burocrático cujo nível de accountability é irredutivelmente separado do que se passa na vida fiscal, orçamentária e institucional, do país.

Proposições falsas podem fazer sentido, mas não ciência. Proposições falsas e verdadeiras não podem e não devem ser transportadas, sem filtros como os das prerrogativas fundacionais do estado de direito e dos direitos fundamentais, para o âmbito judicial. Proposições falsas não podem é mandar ninguém preso e nem fundamentar o enjaulamento de pessoas.

E aí o problema lógico ganha um contorno mais grave: ele serve ao delito, ao crime, ao arbítrio.

Agora respondam: por que um juiz brasileiro não pode enviar alguém para a cadeia ou autorizar a delinquência de um par, com base na receita de ovo frito?

Espero em breve ter isso mais organizado (estudo o Roxxin, no momento, e espero publicar este texto, se ele ficar mais bem trabalhado). Uma das vantagens de ter perdido tantas coisas e de viver o direito como algo nada trivial, é poder, sem medo de punição além das que já recebi e receberei, chamar atenção para isto: o golpe em curso, no Brasil, não é parlamentar. E quem pensa em termos democráticos e defende a democracia precisa voltar os olhos e a inteligência para esses setores de opacidade, predação e violação de direitos, que contaminam e inviabilizam a economia, a vida institucional e as relações de representação, no país.

Moro, Polícia Federal e a possível artimanha nas prisões temporárias

Que as justificativas para as prisões eram todas semelhantes independentemente da situação específica de cada acusado até eu, que sou muito mais bobo, já havia percebido. Chamei a isto de pretextos “copia-e-cola”.

Trata-se de um texto para discussão escrito pelo jurista Afrânio Silva Jardim. Se confirmadas as desconfianças do autor, trata-se de fato muito grave, a exigir ação exemplar do Conselho Nacional de Justiça.

Leiam e tirem suas próprias conclusões.

Paulo Martins

AGORA  PERCEBI UMA ESTRATÉGIA ILEGAL DA “OPERAÇÃO LAVA-JATO” PARA TENTAR LEGITIMAR ALGUMAS PRISÕES.

A estratégia seria esta: a polícia federal representa pela prisão preventiva do indiciado e o juiz, mostrando não ser tão severo, decreta a prisão temporária, que é menos gravosa.

Como não estão presentes os requisitos da prisão temporária (cito abaixo), o juiz Sérgio Moro invoca a regra do art.312 do Cod.Proc.Penal e trabalha com os requisitos da prisão preventiva. Forçando a mão, ele se utiliza dos conceitos indeterminados previstos na lei: “garantia da ordem pública”, “conveniência da instrução criminal” e “assegurar a aplicação da lei penal”.

Mesmo assim, ele não aponta as condutas ou fatos concretos que justifiquem a custódia cautelar, mas, de qualquer forma, consegue disfarçar a legalidade da medida coercitiva, pois fundamenta a sua decisão com base em requisitos genéricos. Para a prisão temporária, o legislador foi preciso e objetivo. Confira abaixo.

Desta forma, como os indiciados têm identidade certa e residência fixa, ele teria de afirmar que as prisões seriam “imprescindíveis” para as investigações do inquérito policial, o que não teria qualquer pertinência nestes casos. Para a prisão temporária, o requisito é claro e objetivo e o magistrado não teria como contorná-lo …

Como dizer que a prisão do ex-ministro Palocci seria imprescindível, se os fatos são muito antigos e as investigações estão ocorrendo, ao longo de anos, com ele em liberdade?

Mesmo que se admita uma “fungibilidade” entre as duas espécies de medidas cautelares, torna-se imperioso que estejam presentes os requisitos legais da prisão que venha a ser, ao final, efetivamente decretada. É até mesmo intuitivo.

Note-se, por derradeiro, que a DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA SÃO UNÂNIMES EM DIZER QUE NÃO SE EXIGEM TODAS AS TRÊS HIPÓTESES PREVISTAS NOS INCISOS ABAIXO. É NECESSÁRIA A HIPÓTESE DO INCISO III (prova de autoria ou participação em um dos crimes graves elencados) e MAIS A HIPÓTESE DO INCISO I OU O INCISO II).

Vale a pena repetir e esclarecer novamente: ALÉM de prova de autoria ou participação em um dos crimes graves elencados pelo legislador, a lei especial exige também, para a caber a prisão temporária, que o indiciado não tenha residência fixa ou não forneça elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade ou ainda seja a prisão imprescindível para as investigações do inquérito policial.

Vejam como estão previstos, na própria lei, os requisitos da prisão temporária, que, habilmente, acabam não sendo considerados … Artimanha ilegal, dotada de certa dose de cinismo.

LEI Nº 7.960, DE 21 DE DEZEMBRO DE 1989.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1° Caberá prisão temporária:
I – quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
II – quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;
III – quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
(segue então uma grande enumeração de crimes, que não cabe aqui examinar).
(segue então uma grande enumeração de crimes, que não cabe aqui examinar).

Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Proc.Penal (Uerj).

Temer e Moro: estratégias conformes para controle da Lava Jato

Muita gente desconhece que o juiz Sérgio Moro escreveu em 2004 um artigo intitulado “Considerações sobre a Operação Mani Pulite”, publicado na Revista CEJ, do Centro de Estudos Judiciários, de jul/set. 2004.

A estratégia do núcleo responsável pela Operação Lava Jato formado pela força-tarefa do Ministério Público, pela Polícia federal e pelo juiz Sérgio Moro está claramente delineada neste artigo.

Minha tese é que a estratégia de Moro está conforme com a estratégia do governo Temer, dos meios de comunicação oligopolizados e dos partidos políticos amigos e que há um grande acordo tácito para limitar a Lava Jato  a determinados partidos e atores. A Lava Jato, tal como concebida pelo juiz Moro e explicitada em seu artigo, não tem força suficiente para ampliar a sua atuação e atingir a imprensa e os partidos amigos, da qual é refém.

Quase todos os atos reprováveis praticados pela Lava Jato estão confessados  e justificados no citado  artigo do juiz Moro.

Os principais pontos da estratégia do núcleo operativo da Lava Jato mencionados no artigo são:

  • Deslegitimação da classe política;
  • adoção, desde o início do inquérito, de uma estratégia de investigação que submete os investigados e suspeitos à pressão para confessar;

  • ganhar para a magistratura – na Itália, a magistratura inclui o Ministério Público e os magistrados – uma espécie de legitimidade direta dada pela opinião pública;

  • fazer prisões preventivas, manter o investigado em isolamento e fazer interrogatórios separados;

  • realizar vazamentos sobre confissões, delações ou documentos apreendidos para jornais e revistas simpatizantes da operação;

  • municiar a imprensa com constante fluxo de revelações para manter o interesse do público elevado e os políticos visados na defensiva;

No artigo o juiz Sérgio Moro considera os ritos necessários para prisão, adotados na Constituição Federal e no Direito Penal nacional, como um “excesso liberal”.

Sem as prisões arbitrárias, falsas, baseadas em um conjunto de pretextos  “copia e cola”, desmoronaria a estratégia do núcleo responsável pela Lava Jato, confessada no artigo em comento.

Levar os presos para Curitiba faz parte da tática de intimidação dos suspeitos estrategicamente selecionados.

O núcleo operador da Lava Jato tem um quebra-cabeça já montado, preenchido sem provas, com os futuros condenados já selecionados. Sua atuação, com a estratégia delineado no artigo, visa formar convicção para condenar  atores previamente selecionados, sejam culpados ou não. Não havendo provas, servem indícios, ligação de pontos, ilações, pauerpointes e delações torturadas.

Considero o artigo uma confissão da utilização de métodos de tortura, da procura por uma “legitimidade direta” obtida nas ruas ao atropelo da Constituição e da manipulação midiática com criminosos vazamentos seletivos para órgãos selecionados.

O juiz Moro reconhece que “há sempre o risco de lesão indevida à honra do investigado ou acusado”. Menciona o caso do político italiano Giulio Andreotti, líder da Democracia Cristã e ex-primeiro-ministro, processado pela Procuradoria de Palermo em 1993 e absolvido. Nas suas palavras:

“O fato é que Andreotti, seja ou não culpado, foi, mais recentemente e após várias decisões e apelos, absolvido das acusações por falta de provas”.

Ora,  como um juiz, ou qualquer operador da justiça, pode ainda considerar alguém culpado – “seja ou não culpado”- se esta pessoa foi absolvida?

Não conheço a situação específica de Giulio Andreotti nem colocaria a minha mão no fogo por ele. Mas, a realidade é que os processos contra ele tramitaram na justiça e ele foi absolvido. Para considerá-lo ainda culpado, mesmo após os julgamentos, o juiz Moro deveria apresentar em seu artigo informações sobre as provas que o levaram a duvidar da decisão da justiça italiana.

Fascistas são assim. Têm interpretação própria e personalista dos conceitos de direito e justiça. Suas convicções contra o investigado permanecem mesmo após trânsito em julgado de sentença absolutória.

Já tivemos, na operação Lava Jato, a citação na grande imprensa amiga e a prisão indevida de diversos inocentes.  Suas imagens foram denegridas e carreiras arruinadas, sem que isso causasse qualquer preocupação no Juiz Moro, no Conselho Nacional de Justiça ou na instância máxima de julgamento e condenação no Brasil: a mídia amiga.

Estou escrevendo este artigo e observando o espetáculo da prisão do ex-ministro Antônio Palocci. O modo de operação segue exatamente o roteiro predefinido pelo juiz Moro. O advogado de defesa de Palocci reclama que não sabe quais são as acusações que pesam sobre o seu cliente. O processo continua absolutamente sigiloso, até para a própria defesa. Mas a imprensa amiga já foi previamente municiada com vazamentos seletivos e já houve uma sessão de acusação – entrevista coletiva dos procuradores da força-tarefa – sem a possibilidade de defesa.

Em sua confissão no artigo em análise, o juiz Moro esqueceu-se de citar outras importantes táticas de sua estratégia ilegal:

  • Manter o processos em sigilo sem dar acesso à defesa;
  • selecionar cuidadosamente os partidos e os políticos que serão investigados;

  • selecionar as delações que serão consideradas válidas e aceitas;

  • definir critérios sigilosos para aceitação de delações.

  • Esta tática de centrar as investigações em poucos partidos e em determinado grupo de políticos em vez de prender e forçar a delação de todos os suspeitos já citados, de todos os partidos, visa manter o apoio da mídia amiga, que tem os seus partidos protegidos, de estimação.

    Como bem observou o juiz Moro em seu artigo: “os responsáveis pela operação mani pulite ainda fizeram largo uso da imprensa.” … “a opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial”.

    Assim, melhor manter felizes a Rede Globo, a Veja, a Istoé, a EXAME, a FSP,  o Estadão, etc… , os políticos, ministros e o presidente da república, que garantem a sobrevivência destes veículos com renovação das concessões, isenções tributárias, desregulação, vistas grossas para sonegações, assinaturas desnecessárias  e empréstimos públicos generosos.

    Pode anotar: no conluio entre a mídia amiga e os partidos políticos ADA – Amigos dos Amigos, Moro não mexerá. Se mexer, a base sobre a qual assenta sua operação Manipule desmorona e a operação termina.

    Pelas últimas notícias da imprensa fica claro que o ministro da justiça de Temer já controla os passos da Lava Jato. É bem-vindo. As estratégias, suas e da Lava Jato, se complementam. Nem a GolpeNews conseguiu negar.

     

    Lava Jato: TRF-4 confirma que estamos em regime de exceção

    “É sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada operação ‘lava jato’, sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no Direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns”, afirmou.

    Perderam completamente a vergonha. Como se pode, em estado democrático de direito, considerar coleta e divulgação ilegal de provas como “situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico” ?

    Se fecham as portas da justiça, a quem recorrer?

    Temos que denunciar. Expor. Questionar.

    Paulo Martins

    SEM FREIOS
    “Lava jato” não precisa seguir regras de casos comuns, decide TRF-4

    23 de setembro de 2016, 18h46
    O Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, nesta quinta-feira (22/9) que a operação “lava jato” não precisa seguir as regras dos processos comuns. Advogados apontam que as investigações ignoram os limites da lei ao, por exemplo, permitir grampos em escritório de advocacia, divulgação de interceptações telefônicas envolvendo a presidente da República e a “importação” de provas da Suíça sem a autorização necessária. Mas, para a Corte Especial do TRF-4, os processos “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.

    Os desembargadores da corte afirmam que as situações da “lava jato” escapam ao regramento genérico. Além disso, “uma ameaça permanente à continuidade das investigações” justificaria tratamento excepcional em normas como o sigilo das comunicações telefônicas. Com base nisso, o colegiado arquivou representação contra o juiz federal Sergio Moro por ter divulgado conversa entre os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

    Em abril, um grupo de 19 advogados pediu o afastamento de Moro depois que ele retirou o sigilo de investigações contra Lula em andamento na 13ª Vara Federal de Curitiba. O problema é que, em uma das interceptações telefônicas, ele falava ao telefone com Dilma, na época presidente da República. Como a Corregedoria rejeitou o pedido, o caso foi levado à Corte Especial.
    TRF da 4ª Região arquivou representação contra Sergio Moro, por 13 votos a 1.
    Agência Brasil
    Por 13 votos a 1, a corte considerou “incensurável” a conduta do juiz e entendeu que somente depois desse episódio, quando o Supremo Tribunal Federal determinou a retirada dessas interceptações, é que a magistratura brasileira teve “orientação clara e segura a respeito dos limites do sigilo das comunicações telefônicas”.

    O relator, desembargador federal Rômulo Pizzolatti, não viu nenhum indício de infração disciplinar. “É sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada operação ‘lava jato’, sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no Direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns”, afirmou.

    “Assim, tendo o levantamento do sigilo das comunicações telefônicas de investigados na referida operação servido para preservá-la das sucessivas e notórias tentativas de obstrução, […], é correto entender que o sigilo das comunicações telefônicas (Constituição, art. 5º, XII) pode, em casos excepcionais, ser suplantado pelo interesse geral na administração da justiça e na aplicação da lei penal.”

    Ainda segundo o desembargador, “a ameaça permanente à continuidade das investigações da operação ‘lava jato’, inclusive mediante sugestões de alterações na legislação, constitui, sem dúvida, uma situação inédita, a merecer um tratamento excepcional”.

    Novidade para os juízes
    Em março, o STF considerou irregular “a divulgação pública das conversações do modo como se operou, especialmente daquelas que sequer têm relação com o objeto da investigação criminal” (Rcl 23.457). Por unanimidade, o Plenário seguiu entendimento do ministro Teori Zavascki, considerando “descabida a invocação do interesse público” para divulgar conversas de autoridades sem autorização judicial do foro competente.

    Pizzolatti citou a decisão em seu voto no TRF-4, mas entendeu que o grampo de autoridades era um “problema inédito” no Brasil. “Não havia precedente jurisprudencial de tribunal superior aplicável pelo representado, mesmo porque, como antes exposto, as investigações e processos criminais da chamada operação ‘lava jato’ constituem caso inédito, trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.

    Nesse contexto, escreveu o desembargador, “não se pode censurar o magistrado, ao adotar medidas preventivas da obstrução das investigações […]. Apenas a partir desse precedente do STF é que os juízes brasileiros, incluso o magistrado representado, dispõem de orientação clara e segura a respeito dos limites do sigilo das comunicações telefônicas interceptadas para fins de investigação criminal”.

    O relator disse ainda que Teori não apontou indícios de infração administrativa ou penal na conduta de Moro, pois caso contrário teria encaminhado as peças ao Ministério Público e aos órgãos correicionais competentes, como o TRF-4 e o Conselho Nacional de Justiça.

    Segundo ele, a publicidade tem sido o meio mais eficaz de impedir quaisquer barreiras ao andamento das investigações e processos criminais, “voltados contra altos agentes públicos e poderes privados até hoje intocados”.

    O desembargador federal Rogério Favreto foi o único a divergir — o voto ainda não foi divulgado.

    Justificativa
    Em resposta ao Supremo, Moro havia declarado que o ato de divulgar as conversas poderia “ser considerado incorreto”, mas disse que em nenhum momento teve objetivo de “gerar fato político-partidário, polêmicas ou conflitos, algo estranho à função jurisdicional”.

    A intenção foi simplesmente, de acordo com o juiz, atender pedido do Ministério Público Federal e dar publicidade ao processo e “especialmente a condutas relevantes do ponto de vista jurídico e criminal do investigado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”. Numa ligação, Dilma disse que enviaria um “termo de posse” para o ex-presidente, que deveria ser usado “em caso de necessidade”.

    O petista foi efetivamente nomeado chefe da Casa Civil dias depois, mas a posse foi suspensa pelo ministro Gilmar Mendes, do STF. Para ele, a medida tinha como objetivo apenas fazer com que eventual denúncia contra Lula fosse julgada pelo Supremo.

    Clique aqui para ler o voto do relator.
    Revista Consultor Jurídico, 23 de setembro de 2016, 18h46

    Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos

    Clique no link abaixo e leia o relatório:

    http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/agrotoxicos_otica_sistema_unico_saude_v1_t.1.

    Foto: Fabián Piris sofre de hidrocefalia e de retardo mental irreversível. Sua mãe entrou em contato com o pesticida Roundup durante a gravidez. Leia mais no site abaixo:

    http://www.lifesafe.it

    El-costo-humano-de-los-agrotoxicos-glifosato

    Análise técnica da decisão do Juiz Moro contra Lula e demais denunciados, por Afrânio Silva Jardim

    Do Facebook de João Lopes.

    Fiel ao comportamento ético e equilibrado deste blog, sempre interessado em oferecer um contraponto e análise aprofundada dos temas abordados, compartilho análise técnica do jurista Afrânio Silva Jardim. Leia abaixo:
    ” ANÁLISE TÉCNICA E RESUMIDA DA DECISÃO DO JUIZ SÉRGIO MORO QUE RECEBEU A DENÚNCIA CONTRA O EX-PRESIDENTE LULA E OUTROS ACUSADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
    Inicialmente, volto a ressaltar que não tenho nenhum interesse pessoal que me motive a escrever este singelo texto. Não advogo e não conheço os advogados do ex-presidente Lula e dos demais acusados. Minha conduta é impulsionada pelo meu temperamento irrequieto, pela minha constante luta por justiça e pelo fato de ser, por trinta e seis anos, professor de Direito Processual Penal. Até por que, meus alunos vão fazer indagações a respeito de todas estas questões jurídicas …

    Cabe esclarecer, ainda, que não tenho tempo agora para me aprofundar nas questões que vou suscitar abaixo. Por outro lado, vou me ater à parte da decisão que acolheu a imputação feita em face do ex-presidente Lula, que ocupa cerca de 95% da decisão ora examinada.

    Note-se que, em relação à esposa do ex-presidente, o magistrado se utiliza de apenas um parágrafo, no qual até suscita dúvida sobre o dolo da Dona Marisa …

    Feitas estas considerações preliminares, vamos à análise jurídica da decisão do juiz Sérgio Moro. Entretanto, adiantamos uma assertiva relevante: NÃO ENCONTRAMOS, NESTA DECISÃO, O RECONHECIMENTO DE QUALQUER PROVA, AINDA QUE MÍNIMA, DE UMA CONDUTA ESPECÍFICA DO EX-PRESIDENTE LULA QUE O TORNASSE AUTOR, CO-AUTOR OU PARTÍCIPE DOS CRIMES PRATICADOS PELOS FUNCIONÁRIOS DA PETROBRÁS. TAIS CRIMES SÃO COMISSIVOS E NÃO HÁ PARTICIPAÇÃO POR OMISSÃO EM CRIME COMISSIVOS. SABER DE UM ESQUEMA CRIMINOSO NÃO TRANSFORMA A PESSOA EM PARTÍCIPE DE TODOS OS CRIMES QUE TERCEIROS VENHAM A PRATICAR. ALIÁS, NÃO SE AFIRMOU SEQUER, NA DENÚNCIA E NA DECISÃO JUDICIAL, QUE ESTE ACUSADO SABIA QUE UM OU OUTRO CONTRATO DA PETROBRÁS ERA ILEGAL …

    Para facilitar o nosso entendimento, vamos apresentar os questionamentos em tópicos distintos e objetivos:

    1 – De há muito vínhamos alertando para a indesejável litispendência, já que a denúncia dos promotores de justiça de São Paulo ainda não tinha sido submetida ao necessário juízo de admissibilidade pelo Poder Judiciário.

    Pela primeira vez, ao que saibamos, um juiz rejeitou uma denúncia em autos distintos daqueles onde ela se encontra. Pela primeira vez, vi um juiz disfarçar a decisão de rejeição, ainda que parcial, por meio da seguinte expressão: “deve ela ser devolvida, com a supressão porém de todas as imputações relacionadas ao ex-presidente da república e seus familiares e igualmente em relação a qualquer fato envolvendo o apto. 164-A do condomínio Solaris” (fls14 da decisão).
    Percebe-se que o Dr. Sergio Moro evitou dizer que os promotores de São Paulo acusaram o ex-presidente Lula, neste particular, sem suporte probatório mínimo, até por que, logo adiante, diz que o Ministério Público de São Paulo se equivocou ao vincular o Triplex às fraudes no âmbito da Bancoop.

    2 – O magistrado esclarece que haveria justa causa para todas as imputações, mas não explicitou o que ele entende por esta categoria jurídica processual. Venho tratando desta controvertida questão em vários trabalhos recentes, que se encontram publicados no site Empório do Direito e na última edição do livro que publiquei, em coautoria com o prof. Pierre Souto Maior Amorim. Ressalte-se, ainda, que o magistrado, a todo momento, confunde duas categorias processuais distintas, confunde ação com processo, numa total falta de técnica.

    3 – Vale a pena repetir: ciência genérica (não provada) de esquema criminoso não transforma esta pessoa em autor, coautor ou partícipe.

    É preciso que se tenha prova, ainda que mínima, de alguma ordem específica dada para o autor imediato praticar o crime.
    Ademais, os diretores e gerentes da Petrobrás sequer são nomeados pelo presidente da república …

    4 – Ainda sobre a questão supra, a fls.5 de sua decisão, o magistrado, após consideração sobre outras condenações por fraudes na Petrobrás, afirma que “questão diferenciada diz respeito ao envolvimento consciente ou não do ex-presidente no esquema criminoso”. Que conduta do Lula caracterizaria este “envolvimento consciente”? Se existe, qual a prova mínima neste sentido? O certo seria verificar e mencionar uma conduta específica de participação direta nos contratos lesivos e individualizados da Petrobrás.

    5 – Ainda, mais uma vez, sobre esta questão central da existência ou não de conduta de participação dolosa do Lula em face dos contratos, consta da decisão, a fls.6, a genérica expressão “conhecimento e participação dolosa” … Indago, participação dolosa através de que ato (conduta) do ex-presidente Lula?

    6 – Note-se que o magistrado apenas se preocupa com a existência ou não de mera ciência do Lula em relação às fraudes em geral. A fls.11 de sua decisão, isto fica claro quando ele disse que iria individualizar as condutas, mas, na verdade, tudo deduz da suposta circunstância de que o ex-presidente, sendo beneficiário direto das vantagens concedidas pelo grupo OAS, “teria conhecimento de sua origem no esquema criminoso que vitimou a Petrobrás”.

    Pergunto novamente apenas para argumentar: ter conhecimento de um “esquema criminoso” transforma a pessoa responsável penalmente por todos os crimes que venham a ser praticados? Alguém pode ser partícipe apenas porque sabe da existência de crimes? E a prova deste conhecimento pode ser deduzida pelo fato de ser o beneficiário de vantagens?

    7 – Aqui, já não mais vamos debater, em profundidade, a questão do apartamento Triplex de propriedade da OAS.

    No direito brasileiro, só é proprietário quem tem o seu contrato registrado no Registro Geral de Imóveis. Ademais, em havendo o crime de corrupção passiva, o que não estamos admitindo, a entrega do benefício dele decorrente seria mero exaurimento deste crime. Como se pode considerar ocultação uma eventual transferência de propriedade imobiliária, que pressupõe uma escritura pública e seu registro também público? Diversamente seria se o imóvel fosse simuladamente vendido ou doado a uma interposta pessoa (laranja) das relações do ex-presidente Lula. No caso em tela, nem transferência houve.

    8 – Ademais, o próprio magistrado reconhece, a fls.8 de sua decisão, que “não foi formalizada a transferência do apartamento 164-A da OAS para eles”. Depois, apenas assevera que o imóvel tinha sido “destinado” ao acusado. Vejam, outrossim, o que está dito na decisão: “há razoáveis indícios de que o imóvel em questão teria sido destinado, ainda em 2009, pela OAS ao ex-presidente e a sua esposa, sem a contraprestação correspondente, remanescendo porém a OAS como formal proprietária e ocultando a real titularidade”. A destinação de um imóvel seria uma reserva em favor do pretendente? Destinação de um imóvel já exige o pagamento de seu preço? Que titularidade é esta sem título????
    9 – Verifico que o magistrado traz à baila, em sua decisão, o sítio de Atibaia, que não é objeto deste processo … Aliás, deveria ser, para que amanhã não se faça imputação de outro crime, pois o sítio seria apenas uma parte das benesses em razão dos mesmos contratos …

    10 – Com relação ao armazenamento de bens, está dito expressamente que foi o Paulo Okamoto quem providenciou a sua guarda, através das empresas Granero e OAS. Pergunta-se: qual a conduta do Lula que o transformaria em coautor ou partícipe da conduta de outrem neste suposto crime?
    Constatamos que, em nenhum momento, o magistrado se refere a qualquer conduta do ex-presidente em relação a este armazenamento. Vejam a narrativa de fls.10.

    11 – Com relação à esposa do ex-presidente Lula, a fragilidade da acusação é reconhecida pelo próprio juiz. Visitar um apartamento e sugerir reformas para uma eventual compra deste não transforma o visitante em proprietário e não é crime de lavagem de dinheiro.
    Cabe ressaltar que o casal sequer teve a posse do imóvel, ainda que por um dia. O juiz não disse que fato, demonstrado no inquérito, lhe autorizaria dizer que haveria dolo da D. Marisa. Ao menos, deveria haver prova mínima deste fato. Na verdade, não há prova mínima deste necessário elemento do crime. Sem ele, a conduta é atípica (tipo subjetivo).
    De forma atécnica, eu diria que é uma “maldade” submeter esta senhora a um processo criminal nestas circunstâncias.

    12 – Finalmente, mantenho o que tenho sustentado, reiteradamente, em relação à competência da justiça federal, do seu foro e do próprio juízo da 13ª.Vara Federal de Curitiba. Neste sentido, vejam os vários trabalhos que publiquei no site Empório do Direito.

    Cabe aqui acrescentar mais um argumento, tendo em vista uma assertiva do magistrado: o fato de um réu ser funcionário público federal, no caso, presidente da república, não determina a competência da justiça federal. Ela é fixada pela constituição, tendo em vista o bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. A Petrobrás é uma empresa de economia mista, de direito privado. Vale dizer, a competência da justiça federal não é determinada intuito personae.

    Por outro lado, eventual conexão com outro crime não modifica a competência se não mais houver possibilidade de unidade de processo e julgamento. A prevenção é critério de fixação de competência entre foros ou juízos igualmente competentes. A prevenção não é critério de modificação da competência. Cuidei disso naqueles trabalhos supra referidos.
    *Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual. Autor de obras sobre a matéria.

    Antunes: 500 corporações do mundo querem impor escravidão moderna e Temer as representa no Brasil — Viomundo –

    Temer é capaz de regredir lei trabalhista à época da escravidão, diz Ricardo Antunes

    Sociólogo contextualiza a reforma trabalhista no Brasil, que devastará direitos conquistados por lutas sociais Rute Pina, Brasil de Fato, 19.09.2016 “Se a moda pega, e se deixarmos, o governo [não eleito de Michel] Temer é capaz de fazer com que a…

    via Antunes: 500 corporações do mundo querem impor escravidão moderna e Temer as representa no Brasil — Viomundo – O que você não vê na mídia

    Lá, como aqui: denunciar fraude nas eleições é estratégia dos Republicanos, por The New York Times

    Artigo publicado na seção de Opinião (Editorial) do jornal The New York Times informa que denunciar que as eleiçòes norte-americanas são fraudadas é uma estratégia antiga do Partido Republicano que, pouco a pouco, vai se fixando como uma mentira amplamente considerada como verdade, especialmente entre os eleitores do Partido Republicano.

    Segundo a matéria, já foram feitos diversos estudos e não foram encontrados indícios significativos de fraude. No caso da eventual troca de eleitor, foram analisados um bilhão de votos relativos a todas as eleições norte-americanas no período de 2000 a 2014 e foram detectados apenas 31 casos suspeitos.

    Nos EUA os eleitores votam sem precisarem de título de eleitor.

    A alegação de fraude pelo Partido Republicano visa forçar a adoção de leis de identificação de eleitores. Com isto, esperam reduzir o comparecimento nas eleições de grupos específicos de eleitores que normalmente votam em candidatos do Partido Democrata, principalmente minorias, pobres e estudantes.

    Não de trata aqui de qualquer posicionamento em favor da candidatura de Hillary Clinton. Trata-se, simplesmente, de constatar o comportamento de perdedores de eleições que, quando não têm apreço à democracia, como é o caso de Trump, lá, e dos golpistas, aqui,  apelam para subterfúgios anti-democráticos.

    Minha opinião é que, se Trump for derrotado e o resultado mostrar pequena margem de votos em favor de Hillary, o assunto da fraude e a solicitação de contagem de votos entrará na ordem do dia logo  após as eleições.

    Só não haverá golpe formalizado pelo Congresso norte-americano. Lá  não há golpe, há “dopping” financeiro para a compra legalizada de votos.

    Paulo Martins

    The Success of the Voter Fraud Myth

    How does a lie come to be widely taken as the truth?

    The answer is disturbingly simple: Repeat it over and over again. When faced with facts that contradict the lie, repeat it louder.

    This, in a nutshell, is the story of claims of voting fraud in America — and particularly of voter impersonation fraud, the only kind that voter ID laws can possibly prevent.

    Last week, a Washington Post-ABC News poll found that nearly half of registered American voters believe that voter fraud occurs “somewhat” or “very” often. That astonishing number includes two-thirds of people who say they’re voting for Donald Trump and a little more than one-quarter of Hillary Clinton supporters. Another 26 percent of American voters said that fraud “rarely” occurs, but even that characterization is off the mark. Just 1 percent of respondents gave the answer that comes closest to reflecting reality: “Never.”

    As study after study has shown, there is virtually no voter fraud anywhere in the country. The most comprehensive investigation to date found that out of one billion votes cast in all American elections between 2000 and 2014, there were 31 possible cases of impersonation fraud. Other violations — like absentee ballot fraud, multiple voting and registration fraud — are also exceedingly rare. So why do so many people continue to believe this falsehood?

    Credit for this mass deception goes to Republican lawmakers, who have for years pushed a fake story about voter fraud, and thus the necessity of voter ID laws, in an effort to reduce voting among specific groups of Democratic-leaning voters. Those groups — mainly minorities, the poor and students — are less likely to have the required forms of identification.

    Behind closed doors, some Republicans freely admit that stoking false fears of electoral fraud is part of their political strategy. In a recently disclosed email from 2011, a Republican lobbyist in Wisconsin wrote to colleagues about a very close election for a seat on the State Supreme Court. “Do we need to start messaging ‘widespread reports of election fraud’ so we are positively set up for the recount regardless of the final number?” he wrote. “I obviously think we should.”

    Sometimes they acknowledge it publicly. In 2012, a former Florida Republican Party chairman, Jim Greer, told The Palm Beach Post that voter ID laws and cutbacks in early voting are “done for one reason and one reason only” — to suppress Democratic turnout. Consultants, Mr. Greer said, “never came in to see me and tell me we had a fraud issue. It’s all a marketing ploy.”

    The ploy works. During the 2012 election, voter ID laws in Kansas and Tennessee reduced turnout by about 2 percent, or about 122,000 votes, according to a 2014 analysis by the Government Accountability Office. Turnout fell the most among young people, African-Americans and newly registered voters. Another study analyzing elections from 2006 through 2014 found that voting by eligible minority citizens decreased significantly in states with voter ID laws and “that the racial turnout gap doubles or triples in states” with those laws.

    There are plenty of shortcomings in the American voting system, but most are a result of outdated machines, insufficient resources or human error — not intentional fraud. All of these are made only worse by shutting down polling places or eliminating early voting hours, measures frequently supported by Republican legislators.

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    Those efforts are especially galling in a nation where, on a good day, only 60 percent of eligible voters show up to the polls. The truth is that those who created the specter of voter fraud don’t care about the integrity of the voting system; they want to undermine the rights of legitimate voters because that helps them win elections.

    The scary thing is how many Americans have bought into this charade. It shouldn’t be surprising that the Republican Party’s standard-bearer, Donald Trump, has elevated the lie about voting fraud and “rigged elections” to a centerpiece of his campaign.

    Quatro mitos sobre a crítica de Marx ao Capitalismo (ou “o que a crítica marxiana ao capitalismo não é”)

    Capitalismo em desencanto

    Em 2011, na esteira de um renovado interesse por Marx e por sua crítica ao capitalismo, Terry Eagleton publicou um livro intitulado “Marx Estava Certo”. Cada um dos dez capítulos do livro apresenta uma crítica usual ao marxismo (na maior parte das vezes oriunda do senso-comum) e a resposta de Eagleton. O livro é uma leitura interessante para qualquer leitor interessado, mas as dez críticas selecionadas respondiam a critérios diversos, como o contexto britânico e a subjetividade do autor.

    Marx

    O livro de Eagleton pretendia desenvolver subsídios para o evidente retorno da crítica marxiana ao palco do debate político mundial. Desde a crise de 2008 a percepção do público em geral havia se transformado: subitamente, o capitalismo deixou de ser encarado como um sistema natural e as alternativas – ou ao menos a busca por elas – ressurgiram. A obra marxiana (re)apareceu então como um manancial importante onde…

    Ver o post original 1.118 mais palavras

    Profissionalismo: Governo Alckmin paga R$ 1,5 milhões às empresas de João Dória Jr.

    Tudo entre amigos, com licitação, legalíssimo. Só que não. O dinheiro é público. Não tenho como provar mas, baseado nas evidências explicitadas pelo jornal Folha de São Paulo, autor da matéria, existem fortes indícios de conflito de interesses e forte cheiro de troca de favores.

    Enquanto você batia panela eles contavam dinheiro e votos. Dois elementos inseparáveis.

    Não sei qual o interesse da Folha de São Paulo em detonar a candidatura de João Dória Jr. à Prefeitura de São Paulo. Como todos sabem, Dória é o candidato apoiado pelo governador Geraldo Alckmin, e não agrada todos os caciques do PSDB-SP, que está dividido.

    Compartilho este artigo para ilustrar como funcionam as coisas relativas a dinheiro, voto, apoios e alianças de interesse entre a mídia e os poderes políticos. E, depois, tenho que aturar discursos de falsa ética e neutralidade “jornalísitica”.

    Dóris Jr. tem faro apurado para cheirar dinheiro e oportunidades. Por que será que ele resolveu tentar mudar de lado do balcão de negócios?

    Leia a matéria e tire suas próprias conclusões.

    Gestão Alckmin paga R$ 1,5 mi a Doria Jr., pré-candidato à prefeitura de SP
    Marlene Bergamo/ Folhapress
    Foto: O apresentador João Dória Jr. participa de evento ao lado do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin

    ALEXANDRE ARAGÃO
    DE SÃO PAULO

    13/09/2015 02h00 Erramos: esse conteúdo foi alterado

    O governo do Estado de São Paulo, comandado pelo tucano Geraldo Alckmin, pagou R$ 1,5 milhão ao empresário João Doria Jr., um dos pré-candidatos do PSDB à prefeitura paulistana, por anúncios veiculados em sete revistas da Doria Editora, entre 2014 e abril deste ano.

    Os pagamentos foram intermediados por duas agências publicitárias contratadas pelo governo, a Mood e a Propeg, escolhidas por licitação, e seguiram os trâmites que regulam a publicidade estatal.

    Doria é presidente do Lide (Grupo de Líderes Empresariais), que organiza eventos para empresários de diversas áreas, como o Fórum de Comandatuba, na Bahia. Sua editora possui 19 títulos, que em boa parte são atrelados aos encontros que promove.

    Em um dos casos, o governo pagou R$ 501 mil por um publieditorial –formato em que o anúncio é semelhante a uma reportagem– de nove páginas na revista “Caviar Lifestyle”, que declara circulação de 40 mil exemplares.

    Há casos em que os valores pagos pelo governo foram proporcionalmente maiores em anúncios da editora do que em revistas consolidadas, que passam por verificação independente de circulação.

    No dia 5 de dezembro, o governo pagou R$ 259 mil por um anúncio de oito páginas na revista “Meeting & Negócios”. Em 15 de janeiro, repassou R$ 202 mil por um anúncio de quatro páginas na revista “Líderes do Brasil”.

    Uma propaganda com o dobro do tamanho na “Exame”, da Editora Abril, custou R$ 292 mil. Também em janeiro, por um anúncio de duas páginas na “Época”, da Editora Globo, o governo pagou R$ 71 mil. Já a Editora Três cobrou R$ 479 mil do governo por 18 páginas na “IstoÉ”.

    Nenhuma das revistas da Doria Editora é certificado pelo IVC (Instituto Verificador de Comunicação), que audita a distribuição das principais publicações –como as outras revistas citadas.

    PROXIMIDADE

    Doria é filiado ao PSDB desde 2001, segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Ele foi secretário de Turismo na prefeitura de Mário Covas (1983-86), mas nunca disputou eleições. O empresário mantém relação próxima com Alckmin, a quem apoiou na campanha à reeleição no ano passado.

    Durante a disputa, o grupo organizou encontros entre empresários e os três principais candidatos. Além de Alckmin, foram convidados Paulo Skaf (PMDB), presidente da Fiesp, e Alexandre Padilha (PT), hoje secretário de Saúde da Prefeitura de São Paulo.

    Mesmo nos encontros organizados para os adversários falarem a empresários, Doria ressaltava ao microfone que apoiava a candidatura de Alckmin.

    Três semanas antes do primeiro turno, Doria organizou um jantar em homenagem ao governador em sua casa. Além dos principais expoentes do PSDB, como o senador Aécio Neves (MG) e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, empresários foram ao evento demonstrar apoio a Alckmin.

    Neste ano, em maio, Doria homenageou Alckmin em Nova York, durante encontro organizado pelo Lide em parceria com a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Na semana passada, o governador compareceu a dois encontros do grupo de empresários, na capital paulista.

    OUTRO LADO

    Em nota, o governo do Estado de São Paulo afirmou que “filiação partidária não foi, é ou será o critério que condiciona a escolha de veículos de comunicação que vão divulgar as campanhas publicitárias da administração paulista”.

    A resposta acima não foi publicada na edição impressa da Folha deste domingo (13) por um problema técnico. Questionado pela reportagem sobre a publicidade nos veículos da Doria Editora, o governo paulista enviou as respostas em dois e-mails.

    A reportagem identificou apenas a mensagem com o retorno referente ao gastos de publicidade, e não aquela com as respostas sobre o grupo Doria Editora, que foi identificada como spam (propaganda indesejada) no correio eletrônico do repórter e excluída automaticamente de sua caixa de entrada.

    Na nota enviada pela assessoria de imprensa, o governo cita como exemplo o programa do apresentador da TV Bandeirantes José Luiz Datena, “historicamente filiado ao PT”, e que também foi escolhido pelas agências de publicidade para inserções de campanhas do Estado.

    Em agosto, o apresentador se desfiliou do PT e, assim como Doria, também tem se apresentado como pré-candidato a prefeito de São Paulo.

    O governo de São Paulo reiterou que, para conferir “transparência” à área, recomendou às agências de publicidade que prestam serviços à Subsecretaria de Comunicação que excluam veículos e programas de pré-candidatos dos planos de mídia que divulgam campanhas do governo estadual.

    Doria Jr. e Datena lançaram suas pré-candidaturas em julho. Os documentos examinados pela Folha detalham os gastos do governo estadual com propaganda até abril. As informações mais recentes ainda não foram organizadas para divulgação, segundo o governo.

    “O planejamento de propaganda do governo do Estado é elaborado com base em critérios técnicos, de forma a alcançar diretamente o público-alvo para cada campanha, garantindo o bom uso do recurso público”, diz a nota.

    Segundo o governo paulista, no caso da publicidade veiculada na Doria Editora, “os mesmos critérios técnicos levaram a iniciativa privada, outros governos estaduais, entidades de classe e também órgãos do governo federal a veicular anúncios em suas publicações”.

    A Folha requisitou a mesma informação à Doria Editora que, em nota, afirmou que “não divulga valores de faturamento dos seus clientes, sejam eles públicos ou privados”. O texto ressalta que “este comportamento é exatamente o mesmo de outras publicações”. Segundo a editora, 86% de seu faturamento vem de empresas privadas.

    Sobre os preços cobrados, a editora diz que suas “tabelas de preços são do conhecimento do mercado publicitário e praticadas em negociações com agências e anunciantes, em função do volume e frequência de mídia”.

    “A Doria Editora não pode sofrer qualquer condenação ou juízo de conflito de interesses por agir dentro das estritas regras do mercado publicitário”, finaliza a nota.

    A Folha teve acesso a documentos relativos à publicidade do governo por meio da Lei de Acesso à Informação.

    A reportagem pediu o relatório de mídia da gestão Alckmin, com os gastos em propaganda entre 2013 e este ano, divididos por ano, veículo, tipo de mídia e agência que intermediou, pedido idêntico a outro feito em 2012 –atendido na ocasião.

    O Executivo estadual disse que as informações estão em sites, mas, no trâmite do pedido feito via Lei de Acesso à Informação, a Secretaria de Governo do Estado acolheu o argumento de que os dados pedidos não estão on-line.

    A Casa Civil respondeu que a Folha poderia consultar os documentos, mas não deu os dados organizados, apesar de tê-los. Cerca de 70 mil páginas foram postas à consulta.

    Questionado sobre o tema, o governo reiterou que “não cabe repetir o procedimento de 2012 porque os pagamentos efetivos estão disponíveis em endereço eletrônico”.

    • Erramos
      14/09/2015 14h45 Diferentemente do que informou a reportagem, o governo paulista enviou, sim, à Redação respostas às perguntas formuladas pelo repórter. Por um problema técnico, a reportagem não localizou a mensagem. O texto foi corrigido.

    O Dr. Deltan e o estelionato acusatório, por Fernando Brito

    Compartilhando ….

    O Dr. Deltan e o estelionato acusatório

    Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:

    Reportagem de Mauro Cesar Carvalho, na Folha, produziria um duplo favor à higidez da Justiça no Brasil, se a Justiça brasileira ainda tivesse qualquer preocupação em ser sabia.

    Conta que, no espetáculo pirotécnico protagonizado pelo Dr. Deltan Dallagnol esta semana, constam afirmações que não existem nos autos do processo, mas apenas na anulada tentativa de delação premiada do empreiteiro Léo Pinheiro que, no desespero para livrar-se dos anos de cadeia a que foi condenado por Sérgio Moro, negociava com o Ministério Público.

    Aqueles documentos que vazaram e irritaram o Dr. Rodrigo Janot ao ponto de dizer que tais informações jamais tinham entrado na PGR e a declarar suspensa e nula qualquer tratativa de delação do empresário.

    Revela, portanto, não apenas que foram usadas como base da acusação meras afirmações (obtidas deus sabe como) de um delator, sem investigação que as confirmasse ou desmentisse como algo muito mais grave.

    Comprova que turma do Dr. Deltan era a detentora da delação “que nunca entrou na procuradoria” e, por isso, tudo leva a crer, a autora do vazamento de seu conteúdo, especialmente na parte em que vidou enlamear a honra pessoal de um ministro do Supremo, Dias Tóffoli, por quem os promotores do Paraná nutrem notória ojeriza.

    Se o uso destas informações, cobertas por uma cláusula de confidencialidade até que fossem homologadas por um juiz, num simples e desqualificada revista foram motivo para a furiosa reação de Rodrigo Janot, mandando suspender a planejada delação, o que dirá do “vazamento” incorporado como parte de uma denúncia criminal?

    Num país normal, o caso estaria agora entregue à Corregedoria do Ministério Público e ao Conselho Nacional do MP e p Dr. Deltan convidado a expor a fonte das supostas informações que utilizou em seu espetáculo.

    Afinal, não há sigilo de Justiça no caso e Sua Exibência não pode lançar acusações ao léu, sem dizer em que as baseou.

    Mas o Brasil não é mais um país normal.

    A máquina judicial tornou-se especialista em exercer, na sua ação, um crime, o de exercício arbitrário das próprias razões que, para que todos entendam, defino com as palavras que o próprio MP do Paraná, numa publicação ironicamente chamada de “Pílulas de Direito para Jornalistas“, de 2010, muito antes de ter se tornado o feudo da “Força Tarefa”.

    Quem faz justiça pelas próprias mãos, ainda que para satisfazer pretensão legítima ou que erroneamente considere legítima, comete o crime de exercício arbitrário das próprias razões, previsto no art. 345 do Código Penal, com pena de detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência praticada. Trata-se de crime contra o próprio Estado, ou mais precisamente contra a Administração da Justiça, já que o ato de fazer justiça diante de qualquer conflito é tarefa que incumbe exclusivamente ao Estado, em conformidade com as leis.

    O “vale tudo”, que ao cidadão comum dá cadeia, não dá em nada quando quem produz uma denúncia judicial “para satisfazer pretensão legítima ou que erroneamente considere legítima”?

    O argumento ontológico abdutivo de Dallagnol Ou da falácia do uso da conclusão como premissa, por Gilberto Miranda Junior

    Quando eu tinha uns 17 anos, nascido e criado lá em Neves, São Gonçalo, apareceu em minha casa um trio de “evangelizadores” com bíblias nas mãos, tentando vender as revistas Sentinela e Despertai. Dois homens e uma mulher.

    Propus discutirmos, primeiramente Fora Temer, (digo),  a existência de Deus. A mulher, mais prática, desistiu na hora. Um dos homens ainda insistiu um pouco e também desistiu. O mais “desarticulado” insistiu por meia hora. Em resumo, seu argumento principal era que estava escrito na Bíblia e que a Bíblia era a verdade absoluta. Se eu não aceitava a Bíblia, não tinha como ele provar nada. Basicamente, seu argumento circular dizia que Deus existia porque a Bíblia dizia que existia. E, como o céu, o sol, as árvores e tudo o mais existia, como não teve outro Criador, tudo só podia ter sido mesmo criado por Deus.  Já a existência de tudo no mundo não precisava ser provada, estávamos vendo.

    Pedi para ele guardar a Bíblia e tentarmos discutir sobre a existência de Deus sem a Bíblia. Não preciso falar que eu não tinha a menor condição de discutir, filosoficamente, este assunto. Até então, eu tinha só dúvidas; nenhuma certeza. Estava ali para ser convencido. O evangelizador desistiu. Suas palavras finais: se você não acredita no que está escrito na Bíblia, não tem salvação. Você é que pensa diferente de todo mundo. Você é que tem que provar que Deus não existe. Disse isso e foi embora, furioso.

    O evangelizador era, e eu não sabia, um filósofo à moda Dallagnol. E nem tinha estudado tanto quanto o “ungido” Dr. procurador.  Dallagnol está convicto que Deus existe e cabe a Lula provar que não. Missão impossível.

    Leia com atenção o artigo. É bem interessante e, as conclusões, pessimistas.

    Paulo Martins

    O argumento ontológico abdutivo de Dallagnol
    Ou da falácia do uso da conclusão como premissa

    Publicado em krinos.com.br

    O termo “ontológico” atribuído ao argumento sobre a existência de Deus foi cunhado por Kant, que entendia ontologia como uma filosofia transcendental à priori, ou seja, aquela que dispensa a experiência sensível ou empírica para definir o próprio saber.

    Anselmo de Canterbury (santo católico que viveu entre 1033 a 1109) possui o argumento ontológico mais famoso, estudado e comentado ao longo dos tempos. Anselmo parte da premissa (mesmo que não fique tão evidente em seu texto original apresentado nos capítulos II e III de seu “Proslogium”, escrito em 1078) de que a existência é superior a inexistência. Desse ponto, segundo sua definição de Deus (como o SER mais perfeito e superior do universo), conclui que Ele tem, necessariamente (uma necessidade lógica), de existir. Uma lógica impecável, obviamente: se seres existentes são superiores a seres inexistentes, e se Deus é o ser superior a todos, logo ele necessariamente tem de existir. Não aceitar essa conclusão é incorrer em contradição.

    Todo o problema desse tipo de argumento centra-se no fato de se usar aquilo que se quer concluir como premissa. Para que Deus seja visto como superior a todos os seres, é preciso já admitir sua existência, para depois afirma-la como conclusão. Esse tipo de argumento funciona como um jogo de cartas marcadas, onde se manipula com uma marca a carta que precisa ser encontrada no final para se ganhar o jogo. No limite, é um raciocínio capcioso, uma empulhação, uma desonestidade intelectual. Isso não significa que Deus não exista. Significa apenas que as razões dadas para sua existência, nesse caso, não são suficientes.

    Nota-se que em geral, todo raciocínio de cunho religioso carrega essa distinção argumentativa. Primeiro dispensa-se a necessidade de qualquer demonstração empírica do que se quer demonstrar. Em seguida, munidos de uma premissa que já pressupõe a conclusão a que se quer chegar, declara-se a conclusão como se o fato dela não ter sido diretamente mencionada nas premissas, fosse algo novo e necessariamente lógico. Podemos, ao ouvir, ficar com uma sensação incômoda de que fomos enganados, mas se caso a conclusão for ao encontro do que já cremos, essa sensação é logo abafada e passamos a reproduzir a forma de pensar sem maiores problemas.

    Pensadores como Descartes, Spinoza e Leibniz fizeram variações do argumento ontológico, porém a estrutura do raciocínio sempre foi a mesma. Descartes em suas Meditações Metafísicas dedicou-se a esse tema e tentou provar a necessidade da existência de Deus para que faça sentido a própria existência do mundo externo ao nosso pensamento. Em resumo: se é possível imaginar um ser perfeito em todos os sentidos e que, na perfeição, a existência é um atributo lógico, então Deus, que é perfeito em todos os sentidos, necessariamente, existe.
    Talvez não pelo fato de ser membro da Igreja Batista (embora esse fato possa ter influenciado), o promotor Deltan Dallagnol usa do mesmo tipo de raciocínio para desenvolver a acusação contra Lula. No entanto, olhando seu Currículo Lattes, constatamos que o mesmo se especializou na Harvard Law School em um curso chamado “The Best Explanation of Circumstantial Evidence”. Ou seja, sua especialidade parece ser a de determinar a melhor explicação possível para evidências circunstanciais. Ao lermos a peça acusatória fica claro que, se usada sua expertise acadêmica naquilo que apresentou na denúncia, podemos concluir que, para o promotor, a melhor explicação para um conjunto de evidências circunstanciais será amealhar aquelas que possam confirmar uma crença anterior na culpa de alguém. Isso é problemático demais e equivale a usar um argumento ontológico para a existência da culpa.

    No ano em que cursou Harvard, Dallagnol apresentou um projeto de pesquisa sobre “Melhor explicação da prova indiciária”, com ênfase em provas indiretas e diretas através das “lógicas que guiam o raciocínio probatório”. No curso que fez e no projeto de pesquisa que apresentou há estudos sobre dedução, indução, analogia e inferência para a melhor explicação (chamada IME, mas conhecida também por abdução). No projeto ele conclui que “a prova, inclusive a circunstancial, é melhor compreendida a partir de óculos abdutivos, isto é, via argumentos guiados pela inferência para a melhor explicação”. Mas a questão que se abre é até que ponto a compreensão de uma prova circunstancial lhe daria materialidade para uma condenação?

    O pensamento abdutivo que foi clarificado por Charles Peirce se constitui a essência de seu pragmatismo. Hoje, compõe um dos três tipos de raciocínio lógico para o estabelecimento de hipóteses científicas junto com o raciocínio dedutivo e o indutivo. No entanto seu uso tem elementos característicos. Enquanto o pensamento dedutivo infere casos particulares a partir de um todo conhecido e o pensamento indutivo infere um todo a partir da generalização de casos particulares conhecidos, Peirce considera a abdução como um juízo intuitivo que serve como primeiro estágio de toda investigação científica. Ou seja, a abdução vai reunir elementos novos que podem, hipoteticamente, ser a explicação para um fenômeno, de forma que essa ligação possa ser submetida à indução ou dedução como forma de especificação causal do fenômeno. Cientificamente, no entanto, todo esse aparato racional só será validado a partir da corroboração empírica das hipóteses. O circunstancial deixa margem para dúvidas e, no caso de dúvidas, a vantagem sempre é do réu, conforme reza os princípios do direito.

    Ao se dispensar a necessidade de corroboração material ou empírica e transformar a hipótese abdutiva como a essência do fenômeno, Dallagnol propõe que aceitemos algo como um argumento ontológico abdutivo, por mais que isso encerre uma clara contradição entre termos. Ele quer nos fazer crer que todo o esquema de corrupção na Petrobrás, necessariamente, precisaria ter um chefe maior, e se Lula era o presidente à época e pode ser visto como um elemento comum entre os envolvidos com o esquema (por favor, esqueça aquele Power Point), logo Lula, necessariamente, é o chefe maior do Petrolão.

    Curiosamente, porém, Lula não é acusado por esse suposto crime, embora tenha sido demonstrado por argumento ontológico que o crime não existiria sem Lula. Porém, com base nele, o nosso ilustre promotor chega à conclusão que o tríplex no Guarujá, sendo da OAS e despertando em 2014 o interesse de compra de Lula, então se trata de um bem doado ilicitamente fruto da corrupção. Não importa que não haja prova material dessa afirmação. Importa é que ela é logicamente necessária para se confirmar a metafísica que dá condições para que a realidade atenda os desejos do procurador. O fato de não haver como provar a propriedade do bem atribuída ao acusado, para o promotor, se constitui em prova de que houve a intenção de escondê-la. Carl Sagan estaria se revirando ao túmulo por ver deturpada sua famosa frase: “ausência de evidências não significa evidência da ausência”.

    Se o envolvimento de Lula no Petrolão só é atribuível a partir de um argumento ontológico que insere a conclusão nas premissas, e se a ligação de Lula com o tríplex, a partir desse argumento base, é fruto de um raciocínio abdutivo, ainda estamos diante de uma hipótese a ser corroborada materialmente. Jamais seria considerado fato em qualquer pesquisa científica ou pensamento epistemológico, mas no direito brasileiro é. Nossa análise, obviamente, centra-se na argumentação do promotor e não na pertinência jurídica da peça.

    O grande problema de tudo o que foi apresentado é que no âmbito jurídico é o Juiz  quem decidirá qual tipo de instrumento probatório é mais conveniente para ele, de acordo com suas convicções. Não há, na Lei brasileira, hierarquia de provas. Distinto do direito em outros países, a materialidade da prova não é, necessariamente, superior a uma abdução, pois é o juiz quem decide que prova acatar. Mesmo com a obrigatoriedade de justificar sua escolha, a ausência de provas materiais sobre um fato não tira a capacidade probatória de uma abdução, mesmo que ela seja baseada em um argumento ontológico, como nesse caso.

    Embora os promotores não tenham dito na mesma sentença a frase que tem sido fruto de diversos memes na internet (“Não tenho provas, mas tenho convicção”), ela reflete mesmo o que está em jogo. A confissão de ausência de prova cabal e a convicção inabalável na versão construída dos fatos foram ditas ao longo do discurso da promotoria. A questão a ser respondida é se essa convicção foi construída a partir do raciocínio abdutivo (inferência da melhor explicação — IME) ou se o raciocínio abdutivo foi construído a partir de uma convicção já existente. A resposta está no flagrante uso da falácia embutida no argumento ontológico, onde, necessariamente, a conclusão faz parte das premissas, gerando uma tautologia disfarçada.

    Essa brecha para meras convicções em nossas Leis nos deixa à mercê de elementos ideológicos e políticos nos julgamentos, ou seja, à mercê da subjetividade de alguém cujas motivações estão ocultas, embora no caso de Sérgio Moro, estejam mais do que reveladas. A crescente politização do pensamento religioso não está apenas em projetos como o Escola Sem Partido, mas está presente maciçamente no Congresso e em nosso Judiciário. Laico, nosso estado apenas é no papel. O próprio sistema que molda e sequestra nossas instituições a seu favor tem como elemento substancial a ética protestante, como nos denunciou Max Weber já há mais de 150 anos.

    Portanto, podem esperar, apesar do Power Point tosco e da mera convicção dos procuradores, que não só a acusação contra Lula seja aceita, como sua condenação após rápido julgamento. As cartas estão marcadas desde há muito, independente de sua culpa, o que jamais deixará de ser uma possibilidade concreta.

    Gilberto Miranda Junior participa do Círculo de Polinização do RAIZ Movimento Cidadanista, é editor do Zine Filosofando na Penumbra e Revista Krinos. Escreve para as revistas Maquiavel, TrendR e Portal Literativo.
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