A volta de Janaína Paschoal e o drama dos estudantes da USP

Eu entendo a situação dos estudantes da USP. Certamente não será fácil aturar uma professora desse quilate. Os prejuízos para a formação intelectual e profissional dos alunos será irreparável.

Já estive em situação similar na universidade.

Corria o ano de 1972 ou 1973, ditadura sufocante pós-AI5. Éramos alunos do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal Fluminense.

Disciplina: Moedas e Bancos

Professor: Polenguinho

  • Polenguinho?
  • Sim, Polenguinho.

Explico:

Bem, não é fácil explicar um apelido preconceituoso. Se o apelido fosse “múmia”, seria ofensivo, mas mais fácil de explicar. Seria sobre sua incompetência e não sobre a sua aparência . O professor era um senhor baixinho, gordo e pastoso. Muito branco, faces coradas, parecia um americano. Sempre vestido de terno e gravata, mesmo no verão mais inclemente. Não consigo lembrar o seu nome. Ficou marcado como Polenguinho.

Ortodoxo nos hábitos e na doutrina econômica que professava, como convém a um membro do vetusto Conselho Monetário Nacional, na ditadura militar de 64.

As aulas eram horríveis. Sonolentas, cheias de mofo acadêmico e teorias ultrapassadas, com conteúdo ralo.

Não ficamos parados. Solicitamos à Reitoria a sua substituição por um professor melhor preparado para ministrar matéria tão importante para o curso de Economia. Nenhum resultado.

Fomos à luta. Primeira providência: fazer uma vaquinha para comprar um caixão de madeira e uma coroa de flores com os dizeres: Aqui jaz Polenguinho. Fizemos um enterro simbólico do professor. O cortejo fúnebre circulou pelos andares e pelo pátio da Faculdade de Ciências Econômicas e Administração da Universidade Federal Fluminense. Isso nem abalou o professor.
Ele continuou tentando ministrar suas aulas.

Na primeira prova, ele apresentou as questões, muito fáceis, e retirou-se da sala de aula. Depois de um tempo retornou para a sala de aula, mas teve o cuidado de arrastar os pés e sacudir as chaves antes de entrar na sala. Ridículo. A prova era tão fácil que seria humilhante para qualquer aluno sério tentar colar.

Segunda providência: alunos arrancaram umas quatro ou cinco soqueiras de capim e colocaram, com a terra preta presa nas raízes e tudo, em cima da mesa do professor antes dele chegar para a aula. Ficamos sem saber quem providenciou o presente. O Sr. Polenguinho chegou e, enquanto afastava as soqueiras de capim, jogando-as ao chão, murmurava: “Esses alunos”. E deu aula normalmente, como se nada tivesse acontecido.

Terceira providência: chegamos cedo e colocamos todas as carteiras da sala de aula de costas para a mesa do professor e para o quadro-negro. O professor Polenguinho chegou, olhou aquela situação – todos os alunos de costas -, avaliou que seria ridículo dar aula e se retirou. Um certo tempo depois, apareceu Moacir – o saudoso Môa – gestor administrativo da faculdade para informar que o professor não daria aula e que ia solicitar à Reitoria a sua substituição por outro professor.

É assim que me recordo. Posso ter me enganado em pequenos detalhes pois, afinal, lá se vão cinquenta anos. Mas as linhas gerais são essas.

Sejam criativos alunos da USP.


PauloM

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